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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
Acabo de ler um artigo acerca do modelo de ensino do futuro onde o entrevistado, reitor da universidade do dito estudo, defende a ideia de, no futuro, em vez de propinas, os estudantes pagarem à universidade uma mensalidade como na Netflix e as universidades serem centros onde os alunos vão buscar, ao longo da vida, informações, experiências e serviços.
A ideia dele assenta no pressuposto de as universidades serem centros de conhecimento híbridos onde juntam aulas tradicionais, por exemplo, mentoria, centros de comunicação e experiência. Um aluno pode fazer umas certas cadeiras de um curso e depois ir abrir uma empresa usando professores mentores e, mais tarde, voltar à universidade para completar estudos ou para juntar-se a outros e enveredar por um caminho diferente. Mais, nesta hipótese, os professores dos anos pré-universitários estão em contacto constante com a universidade e os próprios alunos desses anos secundários beneficiam de contactos em ambiente universitário.
Estas ideias parecem-me interessantes. A ideia dos professores das escolas estarem em contacto com as universidades é uma ideia que defendo há muito mas que custa dinheiro. Um professor tirar um ano sabático, de cinco em cinco anos, por exemplo, ou de seis em seis, para tirar um breve curso ou várias cadeiras de cursos diferentes de actualização de conhecimentos, numa universidade. Isto beneficia a qualidade do ensino não-universitário, dos seus professores e tem repercussões positivas nos alunos. Essas formações nem têm que ser completamente presenciais, pode fazer-se, como já se faz, em parte, em modalidade e-learning.
De qualquer dos modos as universidades seriam, de facto, centros de saber e de experiência aos quais os professores não universitários e os alunos, futuros trabalhadores, ficariam ligados e às quais regressariam de vez em quando para mudar de emprego, fortalecer os conhecimentos no seu emprego, etc.
No ensino não-universitário os alunos beneficiavam, em vez de aulas de cidadania e projectos interdisciplinares à martelada (estes projectos sempre existiram mas como obrigam a muito trabalho-extra, dependem da vontade dos professores e alunos), de poderem explorar interesses individuais; mas isto requer dinheiro para não se tranformar esses interesses neste erro desta equipa ministerial de subtrair 25% do currículo de uma disciplina retirando-lhe coerência, complexidade e valor. Seria necessário haver pequenas turmas que agregassem alunos de várias turmas com um interesse comum.... em astronomia, por exemplo, ou fotografia ou outra qualquer área do saber e do fazer.
A ideia de um ensino individualizado ao extremo, nestas idades adolescentes não me convence. Começo a ter a ideia de que é desagregador. Amanhã, como tenho aulas com uma turma onde uma aluna também foi a essa escola na Finlândia e esteve lá uma semana, e como a rapariga é inteligente e observadora, vou pedir-lhe que partilhe a experiência e conte o que viu e vou fazer-lhe perguntas porque até agora só falei com professores e não com alunos acerca dessa experiência. Depois conto.
No fim do século V a.C. os livros circulavam com abundância no mundo antigo e algumas pessoas, como Arsitóteles, tinham grandes bibliotecas particulares. Os Romanos herdaram algumas, confiscaram outras - a de Aristóteles foi confiscada por Sulla aquando do saque de Atenas. Havia bibliotecas públicas, das quais a mais famosa é a de Alexandria com 500.000 rolos. Em algumas dessas bibliotecas públicas era obrigatório os candidatos a leitores fazerem um juramento para poderem ser admitidos. Na Biblioteca de Pantaenus (c. de 110 a.C.) no Agora de Atenas, as palavras do juramento eram as seguintes, Nenhum livro pode ser levado porque fizémos um juramento. [A bibliotaca] estará aberta desde a primeira hora até à sexta.
Ainda hoje algumas bibliotecas requerem um juramento aos seus membros. É o caso da biblioteca Bodleian de Oxford, cujas raízes vêm do século XIV e que obriga os seus novos membros a este juramento, traduzido do juramento antigo, em latim:
I hereby undertake not to remove from the Library, nor to mark, deface, or injure in any way, any volume, document or other object belonging to it or in its custody; not to bring into the Library, or kindle therein, any fire or flame, and not to smoke in the Library; and I promise to obey all rules of the Library.
A manutenção de antigas tradições ritualizadas e comemoradas não são um mero arremedo ou folclore. São um passado tornado presente e uma consciência continuamente renovada dum presente enraízado numa dimensão de totalidade universal da qual somos 'um' momento e não 'O' momento.
Quando esquecemos ou desprezamos as datas, os acontecimentos, os textos, os rituais, as vivências e as pessoas do passado (que no antigo juramento aparecem vivas e atuais na sua preocupação com a responsabilização cívica dos leitores e o cuidado em preservar o saber) desenraízamo-nos e, tal como uma planta ou árvore sem raízes fortes, corremos o risco de quebrar com qualquer tempestade.
Dou-me conta que cada vez sei menos. E isto não é uma confissão de ignorância ou um 'momento zen' ou outra tanga qualquer. É uma constatação. Quanto mais alargo o horizonte mais coisas por explicar descubro. A complexidade dos problemas aumenta o número das variávies a trabalhar o que faz aumentar o universo das dúvidas. Calculo que só quem tem horizontes apertadinhos estará cheio de certezas.
Uns estudaram e passaram exames. Os resultados estão à vista.
outros jogaram nas novas oportunidades'. Os resultados estão à vista...
Quando a forma e a funcionalidade se aliam criam-se estas obras de arte, pequenos-grandes paraísos neste planeta que aos poucos se embrenha nas trevas.
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