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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
Uns trabalham para influenciar a alteração da realidade outros trabalham para manter inalterada a realidade.
via Thinking Art
É o turismo que faz anos, são as cidades que são bestiais, é a costa vicentina e mais não sei quê... o problema é quando se olha de perto...
[relatora da ONU] Foi às “ilhas” do Porto, ao bairro 6 de Maio (Amadora) ou ao bairro da Torre (Loures) “onde não há luz há dois meses” e onde “a comunidade cigana também não tem água”, conta. “Vivem no escuro.
Houve pessoas que me disseram que sentem que o Governo as trata como animais, que têm medo de perder os seus filhos para as autoridades por causa das condições inadequadas de habitação em que vivem
Visitei as “ilhas do Porto”, casas miniatura, com 16 metros quadrados, onde vivem famílias de três ou quatro pessoas.
Demolir casas sem que as pessoas tenham sítio para ir é uma violação do direito à habitação condigna. Não se pode demolir uma casa sabendo que essa pessoa vai ficar sem abrigo: isso é uma violação clara do direito à habitação condigna. Conheci pessoas que disseram que a casa deles tinha sido demolida, que não tinham para onde ir e que não existiam casas de habitação social para eles. Eles não conseguem alugar casas no mercado privado, e o Estado não pode basear-se no mercado privado quando as pessoas não o podem pagar.
há discriminação racial e étnica?
O que posso dizer é que quando há uma população específica que vive em determinadas situações (nos bairros de construção informal são as pessoas de etnia cigana e os afrodescendentes) podemos pensar que eles estão a ser tratados da forma como estão tratados por causa da sua origem étnica ou racial. Posso concluir que há racismo? Não. Pode ser racismo construído: estão construídos determinados sistemas na sociedade em que algumas pessoas ganham e outras perdem, e quem perde são as pessoas de etnia cigana e os afrodescendentes. É uma discriminação e desigualdade construída.
Sobre a turistificação, acho que é necessário implementar regulamentação para controlar a especulação e o número de alugueres temporários, em Lisboa e no Porto. Não é bom para as comunidades, acabam apenas com turistas nos centros das cidades. Há vários modelos: pode-se forçar uma percentagem de rendas acessíveis; dar incentivos fiscais a quem tem alugueres de longo-prazo, por exemplo. Em Vancouver estão a introduzir o aumento de impostos para as casas devolutas.
- Este mural é real?
- É.
- É lindo!
- Não é um mural a sério. Isto é photoshop
- Photoshop! Então, não é real!
- Photshop também é real.
- Mas não é arte real. Real é a pintura de Dali.
- É uma outra aparência da arte.
- Mas se é aparente não é real.
- A aparência também é real.
- Mas não é a original, é uma cópia, logo não é real.
- As cópias também são reais.
- Mas não são verdade.
- A ideia de encher uma parede de cor e amor onde as pessoas mais precisam é bela e verdadeira.
- A arte imaginada pode ser ainda arte?
- Mas existe arte sem ser imaginada?
- Se é bela então é arte?
- Sim.
- E se é arte, é real?
- Sim, e se é real, é verdade.
- Então a verdade e a aparência, o original e a cópia podem ambos ser beleza e verdade?
- E quem diz que a cópia não é um outro real, tão real como o real?
- Podemos graduar a realidade? Um real mais real e um real menos real?
- Não. Se é real, é.
- Mesmo que seja aparência?
- Mesmo que o seja. Se a aparência é, então é real. Uma outra dimensão de real.
- Ah, então não há graus de real mas há dimensões de real.
- Suponho que sim. Contextos de real.
- Humm...
parede com mural na síria (ou photoshop)
Vimos vantagem nesta evolução das 35 para as 40 horas", disse Hélder Rosalino aos jornalistas, em conferência de imprensa no Ministério das Finanças, em Lisboa. (queria dizer 'involução', concerteza...)
Violação de uma aluna de 12 anos por colegas da mesma idade... ... foi apresentada queixa contra três rapazes de 11 e 12 anos, que são ainda suspeitos de na mesma semana terem tentado violar um colega do sexo masculino, dessa vez dentro da escola. (a tal redução de funcionários que melhora o serviço...)
Há alunos que chegam à escola sem ter jantado, no dia anterior, nem ter tomado o pequeno almoço. Tomam uma refeição por dia. É muito triste esta realidade. Infelizmente, tem tendência a aumentar com o desemprego.
As núvens têm estado densas de negro, baixas e ameaçadoras como se estivessem a preparar-se para abafar toda a réstea de luz. É difícil manter o passo neste ambiente de 'pesadumbre'.
...é assim o dia a dia nas escolas: hoje recebemos esta informação:
O serviço prestado pela RCTS ao Ministério da Educação foi cortado. Alerta-se para o facto de não haver internet na escola impossibilitando a planificação de aulas que recorram a este meio. Aguarda-se a resolução deste problema.
São duas coisas diferentes, a realidade e o real. Com a linguagem, os números e as imagens construímos um real que fala sobre a realidade mas que é diferente dela. Assim, por exemplo, apesar das pautas com as más classificações estarem afixadas e todos poderem ver como foram más, esquecemo-nos disso porque o que ficou gravado na mente foram os gráficos de barrinhas coloridas com desvios padrão e inferências de normalidade. Assim se explica também o facto de Portugal estar já com uma realidade de endividamento e pobreza grave e isso ter passado despercebido porque o real simbólico dos números e da linguagem dos políticos e da TV nos diziam outra coisa.
Quem anda nos ministérios e nas escolas de 'ciências de educação' lida com o real -fabricam-no- mas não com a realidade. Qualquer professor sabe que quanto mais alunos tem uma turma, a partir duma certa quantidade razoável, mais difícil de torna trabalhar com ela e tudo exige o dobro do esforço com menores resultados, mas quem está longe da realidade e lida com os números diz calmamente que isso é o senso comum dos professores porque os números até mostram turmas pequenas a terem insucesso. O universo simbólico dos números, revestido depois pela linguagem constrói uma representação da realidade desfazada, que é a que persiste, porque a maior parte de nós não contacta com as realidades mas sim com o universo simbólico que interpreta essas realidades.
Esta diferença entre o real -que diz que os alunos são, teoricamente, crianças, seres em desenvolvimento e em fragilidade- e a realidade onde os alunos são crianças ou adolescentes ou jovens capazes de grandes crueldades, violência e maldades, torna o discurso dos professores (que estão imersos na realidade) e da tutela (imersa no real simbólico) incomensurável: enquanto uns falam de um universo os outros falam de outro e não se entendem, com prejuízo para a organização da realidade...
Outra grande fonte de problemas, penso, é a ideia de mérito, que é muito falaciosa. Eu, por exemplo, faço questão de dar exemplos de pessoas reais que conheço e venceram adversidades com mérito e estudaram vindo de meios desfavorecidos, para motivar os alunos e inculcar neles a ideia de que vale a pena o esforço, mas tenho plena consciência disto ser uma falácia.
Na verdade são muito poucos os que conseguem vencer certo tipos de maus começos de vida e não basta ter mérito: é preciso ter MUITO mérito. Talvez um em cada não sei quantos mil consiga.
A ideia de que os alunos se estudarem muito conseguem sempre, é errada. Nem sempre é possível vencer todas as resistências do meio. Por outro lado, a ideia contrária, que reina ao mesmo tempo que a do mérito - a ideia de que, por estarmos numa democracia todos termos direito a tudo do mesmo modo (se uns passam os outros também têm que passar, mesmo sem estudar; se uns são bons a educação física e têm boas notas os outros também têm direito a ter, etc.) é outra fonte -a oposta- dos mesmos problemas.
Ambas as ideias -que todos têm direito a tudo e que só quem tem mérito é que vence- embora contrárias, vigoram esquizofrenicamente ao mesmo tempo tornando impossível qualquer vector de orientação positivo que ajude os alunos, nomeadamente os que estão sós -sem famílias e contextos seguros e nutrientes- na sua luta por uma vida melhor.
Na realidade (não no real, onde tudo parece sempre possível e a igualdade de oportunidades até tem percentagens favoráveis com paletes de sucesso) o sistema é extremamente injusto e penalizador dos que, à partida, já vão com grandes desvantagens em termos de qualidade de vida e de esperança num futuro de dignidade.
Para nós professores que lidamos com os dois universos, pois que conhecemos muito bem a linguagem e os números do Real, mas estamos todos os dias imersos na Realidade é angustiante testemunhar a hipocrisia do sistema e sentirmo-nos impotentes para inverter a situação.
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