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A caminho da escola

por beatriz j a, em 26.09.19

 

A caminho da escola passo por três casas funerárias. Setúbal está cheia de agências funerárias, vá-se lá saber porquê... se calhar morre aqui muita gente... não sei. Sei que a competição é tão feroz que pagam grandes cartazes publicitários que espalham por toda a cidade com frases do género, 'emergência funerária? Ligue para tal número'... mas que raio de emergência pode haver depois já não haver nada a fazer...? Enfim, ia a caminho da escola e parei para atravessar a rua, fora da passadeira, mesmo em frente  a uma agência funerária, antes das oito e meia da manhã. Já estava aberta e estava um homem vestido de preto a fumar à porta. Parei e ele ficou a olhar para mim - não se via mais ninguém. Pus-me a pensar, 'o que será olhar para os outros de um ponto de vista funerário?' Será que olha para mim e pensa, 'humm, aquela ali ficava bem num caixão castanho daqueles com forro tal e tal' ou, será que me mede a pensar qual o intervalo de preço de funeral típico para uma pessoa com o meu aspecto? Talvez tenha pensado que o dia ficaria ganho se eu morresse ali atropelada -afinal estava a passar fora da passadeira- mesmo em frente da casa funerária de modo a não ter concorrência e começar o dia com uma borla, por assim dizer. Pois, não sei porque entretanto atravessei a rua e fiquei atrás de dois rapazes que iam de mochila para a escola. O da direita tinha ar de quem se senta sempre na primeira carteira e nunca se esquece dos cadernos. Enfim, pus-me a pensar os miúdos como professora.

 

publicado às 16:43


As profissões não são todas iguais

por beatriz j a, em 13.03.19

 

Algumas são radicais porque lidam com as pessoas em situações que de um momento para o outro podem tornar-se extremas e embora a morte faça parte da vida ou, do ciclo da vida, melhor dizendo, é sempre uma fonte de angústia porque as pessoas não são cimentos onde as coisas embatem, são mais esponjas onde elas penetram, por muitas defesas que tenham. 

E nós que somos exteriores também sentimos, embora não como a mesma intensidade, se sentimos a pessoa que sente e queremos confortar mas não sabemos como porque não podemos...

 

publicado às 12:01


Das profissões que impôem respeito

por beatriz j a, em 16.04.18

 

 

É verdade que todas as profissões têm mérito, se são exercidas com profissionalismo e ética mas nem todas impõem respeito que é uma categoria diferente pertencente à dignidade daquelas cujo efeito transformador nas pessoas é duradoro. Por exemplo, uma cabeleireira consegue pôr-nos mais confiantes e animadas mas o efeito não é duradoro.

Há quatro profissões que se destacam pela diferença real duradora que imprimem na vida das pessoas: a profissão de médico, de professor, de juíz e de político. São profissões de serviço e ajuda aos outros. Mesmo que sejam exercidas por pessoas medianas, em termos técnicos, desde que o façam com sentido ético e espírito de serviço, o seu impacto transformador é sempre positivo. Quando são exercidas por pessoas de qualidade superior, então, afectam-nos de modo indelével. O caso do médico é o mais evidente por ser o mais imediato: uma pessoa que consegue tirar-nos a dor, melhorar a qualidade da vida, aumentar a liberdade e, em último caso, manter-nos a vida.

O impacto do professor é menos visível porque a transformação pela educação requer maturação, logo, tempo, mas um professor, mesmo mediano, impacta positivamente a vida dos alunos: descobre-lhes talentos, dá-lhes ferramentas mentais, abre-lhes horizontes, dá-lhes segurança, etc. Se for um professor excepcional transforma a vida das pessoas no sentido de lhes abrir caminhos que lhes multiplicam as possibilidades, internas e externas. E isso é indelével.

O impacto do juíz é tão grande que sem ele não seria possível termos uma sociedade de leis e estávamos entregues à lei do mais forte.

O impacto do político é brutal porque tem o poder de fazer as coisas acontecerem. Mesmo um político mediano, desde que imbuído de sentido de serviço, tem sempre um impacto positivo na vida das pessoas: melhora-lhes as condições de vida e de bem-estar. Um político excepcional tem um impacto que se prolonga por décadas ou séculos, até.

A questão é a seguinte: sendo o poder transformador destas profissões muito forte, quando são exercidas por pessoas que não têm profissionalismo, não têm espírito de serviço, nem têm sentido ético, são destruidoras de um modo também duradoro. O médico destrói vidas, o professor destrói possibilidades, logo, vidas, o juíz destrói vidas e famílias inteiras e, o político, destrói ainda mais possibilidades, logo, muito mais vidas, uma vez que o seu campo de influência é muito maior.

Ora, eu conheço alguns médicos muito bons (um, pelo menos, de categoria muito superior), que usam todos os seus recursos e conhecimentos para nos ajudar; conheço muitos professores muito bons, tecnicamente e em termos humanos, pessoas com consciência do trabalho que fazem e para quem o fazem. Não conheço muito juízes de modo que não sei dizer o que se passa nessa profissão mas sou capaz de dizer alguns juízes portugueses, italianos, americanos que prestaram enorme serviço aos seus países, com espírito de sacrifício até. Já políticos... não sou capaz de dizer um a não ser dos livros de História e, mesmo assim, não é fácil.

Esse é que é o drama porque são aqueles cuja influência mais se faz sentir. Aliás, depende deles, as outras profissões terem uma dinâmica positiva porque quem manda define as condições e as possibilidades do exercício daquelas profissões.

Um político pode não disparar uma arma contra ninguém mas pode, com as suas políticas, fazer com que as pessoas tenham uma reforma miserável e não tenham dinheiro para ir a um médico ou comprar medicamentos. Logo, condenam as pessoas a uma morte prematura. Ou deixam alargar o fosso entre ricos e pobres por razões de incompetência ou corrupção e condenam gerações de famílias a empobrecer, eles, os filhos e os filhos dos filhos. Roubam-lhes as possibilidades de vida.

É por isso que a profissão de político, merecedora do mais alto respeito, não tem o respeito de ninguém: porque os que a exercem muitíssimo raramente o fazem com profissionalismo, espírito de serviço e sentido ético de modo que a transformam num mero comércio e feira de vaidades cujo impacto negativo na vida das pessoas é indelével.

 

publicado às 19:11

 

Conhecer um bocadinho da realidade dos outros porque não são só os professores que andam atacados de burnout.

 

 

 

publicado às 17:04

 

 

Precisa-se de juventude nas salas de professores

 

Precisa-se é de professores no sistema no futuro e com a degradação da profissão, em termos de condições, de exigências, de salário e de estabilidade, quem é que hoje em dia, não sendo tonto, escolhe acabar o curso num mestrado educacional para se ir meter numa profissão degradada?

 

A minha escola tem este ano imensa gente nova. Dezenas de professores novos. Não é verdade que as salas de professores só tenham professores perto da reforma. Como acontece nas escolas, há uma altura em que não entra quase ninguém porque o quadro está cheio e depois há uma altura em que as pessoas atingem uma idade de reforma ou de pré-reforma e em poucos anos saem dezenas de professores que são substituídos, infelizmente como contratados, mas entram. Neste últimos anos, como é sabido, saíram mais de trinta mil professores do sistema, portanto, há professores novos, não são é dos quadros. Este ano a minha escola está cheia de professores novos: novos na escola e novos de idade.

 

Os professores mais novos têm, em geral, mais saúde e robustez que os mais velhos (dar horas e horas de aulas umas a seguir às outras a adolescentes, requer força física e mental e é por isso que até à fulana Rodrigues, os professores, a partir de certa idade, reduziam o número de turmas com que trabalhavam e direccionavam essas horas para outros trabalhos nas escolas, só que ela acabou com essas reduções para poder despachar professores do sistema e porque era uma incompetente elevada ao cubo) e, geralmente, trazem novas ideias o que é bom para revitalizar as escolas mas, não são, por isso, melhores ou piores professores. Assim como há professores mais velhos cuja experiência pouco ensinou e não são piores por ser mais velhos... nunca foram bons. 

 

 

Da minha experiência destes anos todos de lidar com colegas, o que vejo é que há pessoas com jeito natural para a profissão (não gosto de chamar vocação) e isso vê-se desde muito novos: na maneira como lidam com os alunos, como gostam da própria matéria que ensinam, a seriedade com que encaram o trabalho, a combatividade que demonstram e que é absolutamente necessária nesta profissão e a honestidade intelectual e profissional. Depois, há os que não têm muito jeito mas como têm profissionalismo e brio, tornam-se bons no que fazem. Finalmente há os outros, que não sendo maus professores, na maioria das vezes, também não são bons. Estão ali como podiam estar noutro sítio qualquer e vêem tudo como um enjoo, uma chatice, os alunos todos uma chatice, os pais todos outra chatice, as aulas uma enorme chatice, trabalham para as aparências, esquematizam para ter cargos nas escolas, gostam de se sentir importantes, chateiam colegas, adoram burocracias e papéis, não fazem nada com originalidade, é tudo a imitar o que outros já fizeram...

 

Enfim, acho que isto não é exclusivo da profissão de professor mas é assim em todas as profissões e trabalhos de modo que não percebo porque destacam estas características de juventude como se isso fosse o mais importante na profissão. Não é. Ou melhor, só é importante na óptica de se despedirem os professores mais velhos e que por isso ganham mais, por outros mais novos que são mais baratos. Quer isto dizer que se preparam para mais despedimentos disfarçados com discursos de renovação ou algo assim...?

 

 

publicado às 21:12


no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau. mail b.alcobia@sapo.pt

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