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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
- Olá, como vais? - Tudo bem, e tu? Coisas que se dizem, porque é costume. Passaram meses. No mundo exterior, não no interior. Tive um pesadelo hoje. Talvez tenha sido mais um sobressalto. Desde a semana passada que os tenho. Pequenas catarses. Como as fumarolas dos vulcões, para ir aliviando a pressão.
O coração é só um músculo cheio de sangue, tenho que lembrar-me disto.
Passaram meses. A vida não pára mas na verdade pára. Pensei que o tempo curava, mas foi outro sonho. E nem sei se tenho tempo...
Se tivesse asas voava. Se tivesse companhia voava em formação consonante. Olhar as coisas por cima com a distância dos sábios. Sabedoria não tenho. Tenho frases e ideias e milhares de livros na cabeça ou no estômago, não sei. Mas é só isso, nada mais.
O dia amanheceu dum azul límpido indiferente aos cinzentos das vidas. E agora parece uma tarde de Primavera. Mas é um engano, eu sei que é Outono. Era só outro sonho. Há-de passar. Há-de passar.
- Olá, como vais? - Tudo bem, e tu?
A nossa tendência para interpretar inferindo é tão impulsiva, inata e geralmente inconsciente que mesmo se não demoramos o olhar com muita atenção neste pedaço de face incompleto, imediatamente lhe 'reconstruímos' o rosto, interpretamos as feições como sendo de uma pessoa de determinado local, determinada classe social e, até, o estado mental em que a 'pessoa' por detrás da máscara estará.
É toda uma história que se constrói, uma narrativa, muito provavelmente uma mistura entre os nossos conhecimentos e os nossos próprios estados mentais, projectados na figura, a partir da tendência de tornarmos o 'outro' um 'eu' conhecido ou, pelo menos, compreensível, logo, aceitável, integrável no nosso universo cultural/interpretativo.
Da mesma maneira que fazemos isto a uma imagem também o fazemos ao discurso dos outros que é sempre uma espécie de rosto incompleto, já que as pessoas não fazem dissertações umas para as outras sobre os assuntos de que falam. A diferença é que 'os outros' não são máscaras inertes mas organismos vivos com os seus universos culturais interpretativos e volições próprias, de modo que as consequências deste impulso interpretativo inferencial são problemas nas relações interpessoais.
Teotihuacan
0-650 A.D.
Este é o tempo de pensar.
Societies that are divided about the values that constitute a way of life are unlikely to unify around wider civilisational values. (Frank Furedi)
Dou-me conta que cada vez sei menos. E isto não é uma confissão de ignorância ou um 'momento zen' ou outra tanga qualquer. É uma constatação. Quanto mais alargo o horizonte mais coisas por explicar descubro. A complexidade dos problemas aumenta o número das variávies a trabalhar o que faz aumentar o universo das dúvidas. Calculo que só quem tem horizontes apertadinhos estará cheio de certezas.
"O coração, se pudesse pensar, pararia."
Das ciências exactas às sociais e humanas, as dificuldades na escrita e na oralidade são comuns aos alunos da maioria dos cursos e universidades.
"Na generalidade, escreve-se como se fala. Os alunos distorcem as palavras para permitir uma colagem entre a grafia e a fonética."
Boa parte dos estudantes universitários é incapaz de escrever sem erros ortográficos, encadear um raciocínio com princípio, meio e fim, interpretar um texto ou perceber o que é dito na aula.
Oralidade Pior do que a escrita é a oralidade, esclarece Miguel Morgado do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa. Quando o desafio passa por verbalizar uma ideia ou expor um raciocínio, as fragilidades triplicam: "Há uma enorme dificuldade de os alunos conseguirem responder a uma pergunta com princípio, meio e fim.
O que espanta é que estes factos sejam ainda notícia. Depois de anos de programas imbecilizantes onde os grandes autores portugueses foram substituídos por textos jornalísticos, textos informativos e até, textos de conversas de participantes de 'reality shows', o que espantaria era que se continuasse a falar, compreender e escrever o Português correctamente. Hoje em dia já começa a ser difícil arranjar manuais de filosofia que tragam os textos dos filósofos. A maior parte, o que tem em abundância, são textos de indivíduos que leram outros indivíduos, que por sua vez leram os filósofos, de modo que, por vezes, por ignorância, atribuem a esses comentadores os pensamentos que ,efectivamente, dos filósofos. Isto na onda de toda a gente se achar credenciado para comentar e criticar filósofos. Os textos vêm acompanhados de imagens infantis que nem educam o gosto, nem têm relevância para os conteúdos.
Os alunos escrevem como falam porque não se lhes exige que desenvolvam um raciocínio articulado seja sobre o que for na maior parte das disciplinas. Pensar e raciocinar estão fora de moda no ensino. Por ordem superior. Os testes e exames são com questões de escolha múltipla, mesmo nas disciplinas das Humanidades.
O trabalho que custa, nas turmas do 10º ano, habituá-los a tirar apontamentos espontânea a autonomamente, ensiná-los a saber formular uma dúvida em vez de apenas dizerem, 'não percebo', ensiná-los a diferenciar operações como explicar, justificar, discutir, problematizar, etc., ensiná-los a ler um texto de modo a serem capazes de compreender o que lá está escrito, ensiná-los a expôr uma ideia por escrito, explicar-lhes os benefícios da pontuação, da utilização de parágrafos...
Mas tudo isto é incompatível com o não incomodar os meninos e passar todos de qualquer maneira para não arranjar conflitos. Aliás, nisto da educação, onde não há conflito não há evolução. Toda a evolução tem na base um conflito, um desequilibrio, uma crise, que depois se resolve positivamente, ao contrário do que pensa a nossa ministra que entende isto de ensinar como sermos todos queridinhos uns para os outros.
- Olá, como vais? - Tudo bem, e tu? Coisas que se dizem, porque é costume. Passou um mês. No mundo exterior, que no interior ainda lá estou. Tive um pesadelo hoje. Desde a semana passada que tenho tido um por noite. Pequenas catarses. Como as fumarolas dos vulcões, para ir aliviando a pressão do vulcão.
Passou um mês. A vida não pára e pára. Pensei que podia libertar-me, mas foi outro sonho.
Se tivesse asas voava. Se tivesse companhia voava em formação consonante. Olhar as coisas por cima com a distância dos sábios. Sabedoria não tenho. Tenho frases e ideias e milhares de livros na cabeça ou no estômago, não sei. Mas é só isso, nada mais.
O dia amanheceu dum azul límpido indiferente aos cinzentos das vidas. Parece uma manhã de Primavera. Mas é um engano, eu sei que é Outono. Era só outro sonho.
- Olá, como vais? - Tudo bem, e tu?
vincent van gogh amendoeira em flor
(...)
"É curioso que em inglês, a palavra azul (blue) represente tanto o que é depressivo como o que é transcendente; que seja, ao mesmo tempo, a cor da santidade do céu e da pornografia. Talvez isto se deva ao facto da cor azul ficar bem como fundo - os artistas usam-no para criar o espaço nas suas pinturas; as estações de televisão usam-no como fundo onde podem sobrepor outras imagens - de tal modo que representa um lugar que está fora da vida normal, para além, não só do mar mas do próprio horizonte.
Fantasia, depressão e Deus são azuis nos recantos mais misteriosos da nossa consciência.
Até ao século dezoito dizia-se 'blew' (sopro), o que me faz pensar, às vezes, nas calmarias equatoriais - as áreas entre os trópicos de Cancer e de Capricórnio onde os marinheiros chegavam a esperar semanas por uma brisa que soprasse e os deixasse seguir viagem."
Victoria Finlay, Colour, Travels through the paintbox, Folio Society, London
A arte...deve fazer mais do que apenar dar prazer: deve ter uma relação com a nossa própria vida de modo a alimentar a nossa energia espiritual (Sir Kenneth Clarck, Looking at Pictures)
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