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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
Uma colega emprestou-me ontem este livro e como ia dar um teste à turma a seguir aproveitei e li metade do livro enquanto eles faziam o teste. Lê-se muito bem, quer dizer, com proveito, sobretudo se temos referências literárias -os clássicos- e políticas -os dissidentes- russas, porque compreendemos o alcance das suas preocupações e contradições.
O livro recolhe depoimentos e impressões de russos de várias idades e épocas, pré e pós Estaline e pré e pós Gorbachev. Mostra o povo russo profundamente dividido quanto ao que o presente fez do seu passado.
O que os une é a desilusão do presente e a busca de um sentido. Uns lamentam a desilusão da Liberdade. Pensavam que depois de Gorbachev nada seria como dantes e em pouco tempo viram uma nova espécie de ditadura regressar e tirar o sentido a essa esperança.
Os mais velhos lamentam que os sacrifícios que fizeram, muitos tendo sido presos e torturados, tenham sido para nada, quer dizer, para a Rússia se tranformar num grande mercado de consumo. Dantes buscavam a justiça, agora buscam o último telemóvel... esses preferiam o tempo de Estaline porque pelo menos aí os russos tinham uma alma, uma identidade e uma força no mundo. Têm vergonha de terem sobrevivido às torturas bárbaras de que foram alvo como se fosse uma espécie de egoísmo supremo o corpo ter-se recusado a morrer.
Na verdade, nem uns nem outros sabem bem o que fazer da História do seu país: se ter orgulho, se ter vergonha, se lembrar, se esquecer... os mais velhos não querem não ser comunistas porque isso parece-lhes uma confissão de inutilidade de vida, quer dizer, qual o sentido da luta de uma vida inteira contra o capitalismo se agora se submetem aos seus ideais que vêem como fúteis?
É triste, tantas gerações desperdiçadas em guerras, em perseguições, em torturas, em Gulags... tantas vidas interrompidas, tanto talento desperdiçado, tudo por causa de meia dúzia de predadores que chegaram ao poder... e no fim deixar as pessoas meio perdidas na sua História. É triste. Triste, mesmo.
Muito interessante, o livro.
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