MINISTRA GARANTE QUE NÃO VAI RECUAR
Enquanto em Lisboa metade da classe docente protestava contra as políticas do Governo socialista, em Vila do Conde a ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, entregava diplomas a alunos de um Centro de Novas Oportunidades. Sobre a manifestação, a ministra referiu que "os professores têm o direito a manifestar a sua insatisfação e o Governo tem o dever de prosseguir com as políticas públicas em defesa das escolas públicas".
Há uns meses escrevi o que se segue. Está tudo na mesma. Como se previa. Porque já então ela dizia que não cedia. Não porque estivesse certa, mas apenas porque pode.
A ministra não está impressionada e não cede!
Mas então, pergunto eu, a que é que ela cede?
Os professores têm tentado fazer-se ouvir, utilizando os meios próprios das democracias: falaram, avisaram que as coisas nas escolas estavam a resvalar perigosamente; escreveram, pediram aos seus representantes para alertarem o poder, denunciaram a violência, a indisciplina, a artificialidade dos resultados escolares, os perigos e custos da desagregação dos professores por causa dos efeitos preversos que a promoção política de uns professores a chefes dos outros, fixada no Estatuto da Carreira Docente veio gerar; alertaram para o absurdo e injusto campeão da revolta que é este modelo de (não)avalição dos professores.
Nada disto teve eco junto da senhora. Foi como chocar contra uma parede. A ministra nem se dava ao trabalho de fingir que ouvia os professores - dizia, com o maior despudor, não ligar às vozes dos professores, porque não passavam de rebanhos de sindicatos e chamava-nos 'professorzecos'. Que vergonha!
Ela se calhar não sabe, mas os professores são, na sua esmagadora maioria, pessoas com formação académica superior, com estágio profissional e ainda com inúmeras formações mais ou menos especializadas, que são obrigados a fazer sob pena de terem avaliação negativa e não progredirem na carreira (avaliação, sim).
Bem, como nada a demoveu, os professores resolveram fazer uma manifestação, que era um modo de mostrar que estas posições e juízos sobre a educação não eram obra de uns grupos, antes constituiam a visão da quase totalidade dos profissionais da educação.
Não quis saber. Desvalorizou?! Como é que uma pessoa que é chefe duma equipa de profissionais educados e especializados com os quais tem de trabalhar, se dá ao luxo de os desvalorizar? Se isto é uma regra de Gestão eu não a entendo.
Então, eu tenho uma equipa para realizar um trabalho e a primeira coisa que faço é maltratá-la de todos os modos possíveis de maneira a que ninguém consiga identificar-se comigo e com os meus objectivos? Tento pô-los uns contra os outros de modo a que já não consigam colaborar e fazer o trabalho? Faço de modo a que ninguém, na equipa, me tenha lealdade? LOL
Não percebo, mas se é esta a ideia de competência que anima os nossos governantes, muita coisa fica imediatamente explicada.
Mas, voltando à vaca fria, como costuma dizer-se, os professores ainda fizeram uma segunda manifestação, e uma terceira, para mostrar que a luta não era por poderes político-sindicais mas pela sobrevivência da escola. A senhora desvalorizou. Disse que eram agitadores.
Bem, como forma de luta radical fizemos greve, que é assim uma maneira de dizer: olha que estamos todos de acordo e isto significa que a questão é mesmo grave, é necessário olhar para a situação e corrigir o que pode ser corrigido.
Qual foi a resposta? A ministra não cede a ultimatos!! Mas então o que é preciso para que ouça?
Algo de muito errado se passa quando numa democracia nenhum processo democrático funciona.
Penso que a ministra da educação despreza os professores.
Talvez por vivermos numa sociedade em que o sucesso é medido pelo dinheiro que se tem, pelo poder económico, a maioria do povo pensa que ter este tipo de sucesso e ter qualidade são sinónimos.
Por essa ordem de ideias, raciocinam deste modo: se os professores não são (ou não foram) capazes de ter sucesso na vida (ganhar dinheiro e ter muito poder, entenda-se), segue-se claramente que são pessoas sem qualidade.
Deste tipo de raciocínios duas coisas ficam claras:
1ª, quem assim pensa, pensa também que ser professor e dedicar-se à educação é uma profissão menor já que não dá acesso àquele sucesso tão valorizado na sociedade.
A minha pergunta é: como é que alguém que tem em tão baixa estima a educação e a profissão de professor pode estar à frente duma equipa de professores a ditar políticas para a educação? É um contra-senso.
2ª, quem assim pensa não tem uma mente educada no conhecimento da História, por um lado, e na reflexão, por outro. É que a História mostra-nos muitos casos em que as sociedades foram tomadas de decadência das suas virtudes justamente por terem permitido que o sucesso aparente baseado na lógica do simulacro substituisse o saber real. E quem tem hábitos de reflexão descortina isso, por si mesmo, vendo como em tantos casos do quotidiano, pessoas cheias desse sucesso (enchem as televisões) exibem uma confrangedora ignorância a respeito dos assuntos de que falam.
A minha pergunta é esta: como é que se evita que as democracias acabem sempre nisto?
É claro que estas perguntas não são novas. Grandes pensadores já se questionaram sobre elas e sendo tão complexas, não têm respostas simplex.
Enfim, para quem pensa.