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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
Mas porque raio é que um tipo, só porque fez muito dinheiro a vender gadgets que outros inventaram se acha agora um especialista em educação e passa o tempo a mandar palpites sobre o assunto? Se desse metade dos 90 biliões que tem ainda lhe sobrava dinheiro para 100 vidas de luxo, resolvia o problema da fome e da sede em metade ou todos os países de África o que era muito melhor que andar por aí a estragar escolas...
O homem que mais beneficiou a economia capitalista deixou claro a sua incapacidade de lidar com a questão mais premente do nosso tempo: a mudança climática. Em uma entrevista a The Atlantic, o magnata da Microsoft argumentou: “o setor privado em geral é inepto, incapaz como uma ferramenta para gerenciar mudanças catastróficas do nosso clima que ameaçam a vida na terra.
Gates argumenta que os governos têm o papel fundamental a desempenhar no desenvolvimento de tecnologias para um mundo sustentável, principalmente por meio de um forte investimento em pesquisa e desenvolvimento. Ele argumenta que, feito isso, deve ser papel das empresas privadas pagar os custos de implantação dessas tecnologias – prometendo US $ 2 bilhões de seu próprio patrimônio líquido de US$ 79,2 bilhões para para financiar a implantação desses projetos.
Então, por que não podemos confiar no setor privado para investir nas coisas certas no momento certo? Gates, argumenta:
“Bem, não há nenhuma fortuna para ser feita.””Sim, o governo tem sido um pouco incapaz”. “Mas o setor privado em geral é inepto para tomar a frente num projeto de tal envergadura.
Os fatores que levam uma empresa com fins lucrativos a investir são diferentes daqueles do estado. A mudança climática é uma área em que seria um investimento ilógico do ponto de vista corporativo, mas onde o Estado tem um papel claro e lógico.
Quando The Atlantic fez ver a Gates que o grande obstáculo no desenvolvimento de uma resolução impulsionada pelo Estado é a natureza da política dos EUA. Em primeiro lugar, as duas casas do legislativo são controladas pelos republicanos que acham que que a questão da mudança climática é um discurso socialista e segundo, que não há um consenso de que a mudança climática exista mesmo. Gates tem uma visão diferente sobre o problema:
” Às vezes a democracia representativa é um problema.”Há momentos em que não se pode permitir que ” um estado de espírito público mal informado” possa impedir o Estado de tomar medidas sobre os riscos cientificamente comprovado que irão atingir a todos. Este é um desses momentos, argumenta Gates.”
Esta entrevista é muito interessante e dava pano para mangas sobretudo por causa das afirmações sobre pressupostos políticos.
O Gates anda a fazer experiências para motivar professores e, sobretudo, ajudá-los a melhorar. Primeiro entusiasmou-se com as 'charter schools', mas o encanto não durou muito porque os dados mostram que não atingem mais que 10% e o interesse dele é engajar todos os professores do país.
A seguir encantou-se com a ideia de que a chave do problema estaria em escolas pequenas e enfiou uns milhões a reconverter escolas em pequenas comunidades. Também durou pouco porque, apesar dos dados mostrarem que há uma redução significatica da violência e que há uma melhoria dos resultados escolares, essa melhoria não é esmagadora e ele quer uma autêntica revolução na educação.
Agora iniciou uma abordagem diferente: investiu uns milhares em escolas de vários distritos na condição das escolas deixarem que filme as aulas dos professores. Então, anda a filmar milhares de horas de aulas para ver depois, se entre os professores que têm bons resultados (a pontuação tem várias vertentes, donde a mais importante é a avaliação do director da escola, mas também leva em conta os resultados dos exames, a opinião dos colegas e a dos alunos que, descobriu, são uma fonte muito mais fidedigna que os resultados dos exames para avaliar o trabalho dos professores em certas questões) há um padrão que explique esses resultados: que tipos de práticas têm em comum que os distinguem dos outros.
Gates não acredita na publicitação na internet dos resultados dos alunos como estão a querer fazer com o objectivo de intimidar ou humilhar professores. Aliás ele não acredita em transportar para a educação os princípios das empresas de medir os trabalhadores pelos resultados.
É que o problema da educação é o de ninguém saber ao certo o que é que funciona e não funciona na educação. Não é como se os professores fossem maus de propósito: é que é difícil, com tantos factores e variáveis, descobrir o que funciona. Se se soubesse ajudava-se as pessoas a modificar as suas práticas.
Sendo uma área com milhares de empregados onde qualquer estudo implica milhões e biliões nunca se fazem estudos a sério e é preciso aparcer alguém como o Gates, que está disposto a gastar biliões para descobrir quais são os factores chave que fazem com que determinada pessoa seja bom professor. Por isso, ele não acredita em medir a eficácia dos professores pelos exames finais porque estes não nos dizem onde esteve o erro.
Os exames são um único momento no fim do ano quando já não há nada a fazer quanto a corrigir práticas de modo que o interesse dele não é o da constatação de que este ou aquele professor tiveram maus resultados mas perceber porquê, este e aquele tiveram maus resultados e o outro teve-os bons.
Ele quer ajudar a mudar o que não funciona e engajar os professores nessa mudança de modo que acossar e humilhar aqueles que se quer recrutar parace-lhe uma estratégia ineficaz.
Pessoalmente acho esta uma grande oportunidade, a de haver alguém com dinheiro e interesse em explorar hipóteses para melhorar o ensino. Para já, porque nesse percurso vão-se descobrindo outros factores como o das escolas grandes fazeram aumentar a violência. É um bocado evidente que escolas com pessoas à molhada umas em cima umas das outras promovem o conflito violento mas uma coisa é sabermos sem dados, outra é irmos sabendo o que é bom e o que é mau com dados objectivos.
A ideia de filmar e observar o que funciona e o que não funciona parece me um excelente princípio.
ill Gates puts the focus on teaching: Joe Nocera - The Economic ...
Para quem quiser ler um artigo muito bom e fundamentado da Revista Dissent sobre o poder das três Fundações bilionárias (The Bill and Melinda Gates Foundation, the Eli and Edythe Broad Foundation, and the Walton Family Foundation) que controlam a educação nos EUA e o modo como as suas experimentações sucessivas que por ora vão nas famosas Charter Schools e no princípio do pay merit têm falhado sucessivamente bem como as consequências dessas experimentações feitas mais ao menos ao acaso:
Dissent Magazine - Winter 2011 Issue - Got Dough? How Billion...
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