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Abolir notas. Mais uma experiência?

por beatriz j a, em 15.12.14

 

 

 

Em França os alunos podem deixar de ser avaliados com notas em 2016.

 

França debate a abolição das notas nas escolas

 

Em França quer-se abolir as notas porque segundo o Hollande, os alunos as entendem como castigos e ainda porque os critérios de exigência mudam de escola para escola e um 12 numa escola equivale a um 14 noutra. 

Por cá o David Justino resolveu defender que os alunos não devem ter notas senão no 4º e 6º ano embora não apresente nenhuma razão para o facto. Apenas diz que era melhor as notas serem substituídas por avaliações de competências e capacidades gerais.

Em relação a esta questão da avaliação com notas quantitativas, se bem que não seja um sistema perfeito -isso existe?- é melhor que considerações vagas e subjectivas acerca de capacidades e competências do género de diagnóstico próprio de psicológicos e não de professores.

Ou o que se pretende são afirmações 'chapa 5' do género, 'este aluno não atingiu a meta 1 nem a 2 mas atingiu a 3'? Ou ainda, o que se pretende são testes de diagnóstico do tipo: o ponto forte deste é isto e o fraco é aquilo? Por exemplo, este é fraco no calculo. E depois? Os que são fracos vão para a turma dos fracos? Em que é que isso é diferente das notas? Ou vão dar um número pequeno de alunos a cada professor para trabalhar com os fracos?  E no fim da escolaridade quando tiverem que fazer testes e exames com notas como se preparam nunca tendo tido notas quantitativas? 

E há nestas conversas muitos enganos: que a Alemanha e a Suécia não têm notas quantitativas... para já nem é verdade e depois, quem é que quer essses sistemas de ensino que só têm dado problemas? Porque é que vêm cá recrutar engenheiros, médicos e enfermeiros às centenas?

E quem diz que o fim da avaliação quantitativa faz com que os critérios de exigência se uniformizem? Como se os avaliadores, por magia, passassem a ser pessoas idênticas, com percepções semelhantes do mundo, da educação e da melhor maneira de preparar crianças e jovens para o mundo. Só no dia em que os professores e os alunos forem substituídos por robots programados pelo mesmo programa é que isso acontecerá. 

 

Uma avaliação qualitativa é mais justa e menos castigadora? Não necessariamente. Uma avaliação quantitativa avalia o trabalho efctivamente realizado pelos alunos e não faz considerações de ordem valorativa. É certo que um aluno que tire uma má nota tem um conjunto de razões que a explica: pode ser preguiçoso, não ter acompanhamento em casa, ter-se atrasado um ano por qualquer razão (doença, por exemplo), não ter sido estimulado na altura certa, etc. Agora, a verdade é que a avaliação quantitativa não tece considerações: não diz que o aluno não tem capacidades ou qualidades para esta ou aquela disciplina ou matéria nem outras coisas bastante subjectivas e muito mais castigadoras que as notas na pauta.

 

O que deveria mudar não são as notas mas todo o aparato e mercantilização que se faz com as notas porque se as notas fossem vistas como o que são: um indicador da distância a que os alunos estão das finalidades dos programas, não havia dramas com as notas, o que havia era reajustamentos de comportamentos e de trabalho para alcançar finalidades. Quem faz das notas um monstro é o MEC que lhes dá uma importância de gadanha com que corta o pescoço dos alunos de quem se serve como instrumento de políticas duvidosas.

 

Nas minhas turmas nenhum aluno gosta de ter má nota mas nenhum aluno se sente humilhado com as notas por muito baixas que sejam porque estão habituados a ver as notas baixas como um indicador do investimento que fizerem, ou não, no seu trabalho efectivo e não como um sinal do seu valor potencial.  Há alunos como muito potencial que não trabalham nada e têm más notas por isso. O que está certo, porque nós não avaliamos capacidades mas trabalho realizado o que tem uma objectividade muito maior. 

Isso é uma coisa que deixo claro desde o primeiro dia e em tudo o que faço que envolva avaliação: os alunos são pessoas em processo de evolução e nesse processo têm muitos precalços (de trabalho, de comportamento, de atenção, de concentração, de motivação, de gosto, de vida...) e isso é que está na origem das notas que vão tirando, não um suposto valor de competências ou capacidades que uns têm e outros não têm como coisa fixa que é coisa que não me cabe a mim dizer, tipo juíz do futuro alheio.

 

De modo que não entendo o barulho e o drama que se faz em torno das notas e parece-me que este é mais um ruído para alguém parecer que está a fazer trabalho.

Daqui não se segue que não possa achar que tem importância não haver notas nos primeiros quatro anos. Se calhar tem mas antes de se porem para aí com experiências, como é costume, sem pensar e só para imitar outros e para experimentar coisas diferentes, talvez fosse bom pensar seriamente nelas porque a escola não aguenta mais abanos estruturais e na escola tudo é muito complexo e tem efeitos a longo prazo.

 

 

publicado às 21:42


no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau. mail b.alcobia@sapo.pt

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