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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
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Ontem, seis horas e meia de trabalho. Hoje já lá vão cinco. Acho que faltam outras cinco para deixar toda a semana que vem preparada que tenho tantas idas a hospitais, médicos, consultas e cenas dessas que não vou ter tempo para preparar seja o que for.
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Acabei de ver os testes todos e a turma que vi em último lugar deixou-me bem disposta para o resto do trabalho - quatro negativas numa turma inteira e notas bastante boas. Não está nada mal. Ainda vamos no 1º perÃodo. O que tem piada é que esta turma, no ano passado, no 10º ano, foi a turma que me deu mais trabalho.
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Há um certo aparente paradoxo no inÃcio do 10º ano de Filosofia.
Os alunos que vêm com melhores notas do básico, geralmente nas turmas do ramo CientÃfico-Natural, vêm formatados a pensar que a aprendizagem da LÃngua ou de qualquer disciplina das Humanidades é inútil para a profissão que querem seguir.
Ninguém lhes explicou que sem conceitos não têm ferramentas para construir e trabalhar as ideias, que sem correcção lógica no modo como relacionam e trabalham os conceitos e as ideias produzem maus conhecimentos e que a vida não se esgota na dimensão profissional, há muitas outras dimensões essenciais à existência, ao bem estar mental e à felicidade.
Vêm habituados a que lhes ditem definições, fórmulas e respostas dogmáticas e fechadas aos problemas e sentem-se frustrados por uma pessoa lhes dar perguntas, perguntas e mais perguntas... e incertezas também. Alguns, revoltam-se, mesmo e arranjam grandes discussões connosco, o que é óptimo para desfazer todos esses preconceitos de senso comum :)
No entanto, assim que conseguimos abalar essas crenças dogmáticas infantis e pô-los a pensar, tornam-se os melhores alunos porque juntam a vontade de progredir a hábitos de trabalho sistematizado. Enfim, os que o têm claro. É nesse ponto que se encontra esta turma.Â
Uma das negativas é de uma aluna nova na turma. Não sei de onde vem nem o que lhe ensinaram mas num teste sobre a filosofia polÃtica de Rawls resolveu substituir o pensamento do autor pelas suas próprias opiniões sobre a justiça e injustiça da vida e da polÃtica, uma miúda de 16 anos que ainda agora chegou ao mundo... é evidente que só diz disparates num discurso contraditório e ignorante. Esta está no ponto em que os outros se encontravam no ano passado.
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(é nisto que dá o discurso do ministro, do secretário de Estado e da equipa que fez as AE de Filosofia, que querem pôr os alunos a dar as suas opiniões sobre questões filosóficas, cientÃficas e o que mais for, antes de terem conhecimentos - mas enfim, que sei eu... ainda ontem vi no FB um colega que dá aulas de Filosofia numa escola, como eu, apresentar-se como filósofo...lá está, sou eu que devo ser muito burra quando dou por mim a pensar, como o Karl Popper, que está tudo a marchar no passo errado...)
Seja como for, a turma já evoluiu tanto desde o ano passado que não vai ser fácil pô-la ao nÃvel dos outros.
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Em contrapartida, os alunos de Artes e de Humanidades não têm, no geral, rotinas de estudo e trabalho e pensam que a inspiração e o talento chegam e sobram para tudo. À conta disso, já tiveram grandes desaires e isso predispô-los a pensar na vida e nas suas possibilidades, o que os torna receptivos à Filosofia desde o inÃcio. No entanto, como lhes falta essa estrutura de organização de trabalho, a maioria são piores alunos na produção de trabalho com qualidade.
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Enfim, vou fazer um intervalo para almoçar e ver as notÃcias do dia (rir um bocado) antes de me atirar aos trabalhos e à produção de uns materiais para as aulas.
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