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do ensino da Filosofia

por beatriz j a, em 02.09.17

 

 

A moda actual dos fazedores de manuais de Filosofia, em geral, é considerarem-nos como sebentas para os alunos e, por isso, dispensam os textos dos filósofos e substituem-nos por interpretações pessoais dos temas e dos filósofos. Alegam que quando os filósofos escreveram os textos não foi com intenção de serem lidos por alunos do secundário mas por especialistas e também que os alunos não os entendem sozinhos. À conta disso e de partirem do princípio que a Filosofia é mera argumentação técnica, os manuais são longas listas de argumentação dos autores dos manuais. Transformam a análise de um problema numa receita de técnicas, cada uma com o seu nomezinho, às vezes idiota, como por exemplo, falar em argumentação branca e negra, o que até é uma linguagem racista.

 

Enfim, não sei porque se ensinam aos alunos expressões matemáticas e textos da Física em vez de os substituirem por técnicas dos autores dos manuais dessas disciplinas... é evidente que o Newton, o Einstein e muitos matemáticos escreveram para especialistas e não para alunos do secundário...

Nesta posição teórica, os professores são pensados como funcionários/emplastros, aplicadores de técnicas: os livros dizem a argumentação que os alunos devem saber e o professor está ali apenas para testar se a decoraram como deve ser. Depois pensam que estão a dizer a 'sua opinião'.

 

Há uns anos apanhei uma turma de alunos inteligentes que tinham sido de um professor que esteve lá e é o típico representante deste modo de encarar o ensino da Filosofia de modo que treinou os alunos para serem como ele. Os alunos sabiam desfiar todos os argumentos a favor e contra isto ou aquilo mas, quando lhes punha uma questão e lhes pedia para problematizá-la e analisá-la conceptualmente e levá-la até às suas consequências práticas ou até aos seus princípios, não sabiam e limitavam-se a repetir os argumentos que tinham decorado. 

 

Se a Filosofia no ensino secundário não permite uma autêntica metanoia falhou o seu intento. A problematização tem que fazer-se a partir dos filósofos, fontes inesgotáveis de saber e sabedoria e não dos seus interpretadores, técnicos sem espírito, a maioria deles. Mesmo a argumentação, esse instrumento que permite chegar a princípios e à consciência da ligação entre os princípios e os casos práticos, bem como os próprios princípios, devem os alunos haurir de eles mesmos. Essa é a função do professor e não ensinar a argumentar. A argumentação é uma rúbrica do programa, não é 'o' programa.

 

Descobri a Filosofia aos 17 anos com um texto de Heidegger, um filósofo não propriamente fácil de ler. Foi uma revelação e um amor à primeira vista e soube imediatamente que tinha de ir estudar Filosofia. Felizmente, nessa altura, não substituiam os textos dos filósofos por textos de autores de manuais pois muito provavelmente não me teria interessado um átomo.

 

publicado às 12:37



no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau. mail b.alcobia@sapo.pt

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