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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
Do que lemos nos jornais percebemos que a cimeira da UE deixou quase tudo na mesma. Foi dada prioridade à 'devolução' de pessoas que entraram em outros países e foram para a Alemanha -a Merkele a querer apaziguar os parceiros de coligação- e propostos campos para agregar refugiados que são resgatados do mar por parte de países que o quiserem fazer bem como negócios com países africanos para ficarem com eles. Isto não são soluções. São adiamentos de soluções.
Erros: desde o início dos movimentos de refugiados os países, sobretudo os do Norte, desprezaram os receios e argumentos de parte da população e chamaram-lhes populistas e anti-europeus. Estes acantonaram-se e, não tendo abertura para dialogar com as autoridades oficiais, começaram a formar grupos alternativos à posição oficial.
Acontece que esses receios não eram disparatados. Existe, de facto, um problema de choque de identidades culturais entre os europeus e os refugiados que chegam cá. Isso já há muito que é evidente no sul de França onde há escolas onde a maioria dos pais são muçulmanos e fazem exigências de descriminação das raparigas e dos hábitos seculares com base na sua religião. Na Suíça também, e já houve casos que chegaram aos tribunais por os pais exigirem que os filhos rapazes sejam escusados de deveres que implicam apertar a mão a uma mulher, por exemplo, ou que exigem que as raparigas sejam separadas dos rapazes. Há horas do dia em que as ruas são invadidas de pessoas que se ajoelham para rezar impedindo o trânsito, por exemplo. Portanto, havia, e há, um receio de que as comunidades possam perder a sua identidade com um contínuo fluxo de populações de uma matriz cultural muito diferente e oposta à europeia. Isso não foi reconhecido como um problema e por causa disso não houve um esforço para o resolver e deu-se espaço para discursos radicais de parte da população que agora são difíceis de conter.
Esse erro de percepção juntou-se a outro erro que foi os países do Norte, em especial a Alemanha, pensarem que uma das maneiras de travarem o impulso das migrações para Norte seria deixarem os países do Sul e de Leste, portas de entrada dos emigrantes, a resolver o problema sozinhos: a Grécia, a Hungria, a Espanha, a Itália viram-se sozinhas, sem meios, sem apoios, a tratar de um problema que era suposto ser, e é, de âmbito europeu e não apenas deles. Isto, quer dizer, esta maneira de não contribuir para a solução dos problemas, juntamente com os discursos de sobranceria que são o pão nosso de cada dia dos países do Norte acerca dos do Sul foi uma espécie de adubo para os discursos anti-europeus florescerem.
Ao mesmo tempo há aqui uma grande oportunidade perdida que é a de integrar na UE esses refugiados de um modo não conflituoso com a identidade europeia e conseguir, com isso, inverter o problema da falta de população.
Desde o início esse deveria ter sido, acho, o discurso das autoridades europeias: criar uma dinâmica positiva de propostas e estratégias de integração dos muçulmanos nas comunidade europeias. Há muitas maneiras de integrar as pessoas de um modo não conflituoso mas nada foi feito ou pensado. A Suécia foi o único país que tentou fazer isso.
No entanto, mais uma vez os países do Norte, sobretudo a Alemanha que é quem liderava as políticas comuns, desprezou esse caminho, em grande parte porque estava, e continua a estar, convicta de poder resolver o problema da sua falta de pessoas apostando na migração cristã à conta de manter os países do Sul com grandes massas de trabalhadores jovens, pobres. Em Inglaterra, os polacos deixaram de ser vítimas de descriminação e há agora slogans que dizem, 'antes 100 polacos que um único muçulmano'.
Há doze anos, quando a Merkele chegou ao poder, nem a Alemanha nem a Inglaterra, nem a Hungria, a Itália ou outros países tinham problemas de extremistas e populistas que agora têm porque desprezaram as vozes que apontavam para problemas, desprezaram as vontades dos países do Leste e do Sul e sobrevalorizaram a sua influência enquanto líderes europeus.
Ainda estamos a tempo de lidar com esses problemas e criar uma dinâmica positiva e um discurso que mobilize as forças para encontrarem estratégias de integração destes refugiados com benefícios mútuos mas os líderes dos países europeus não estão à altura da situação: uns já são os populistas que querem poder e protagonismo e os outros têm falta de coragem e estão pressionados por lobistas.
Esta foi a cimeira da falta de coragem e visão para lidar com os problemas. Não se discutiram ideias futuras com base em factos e dados acerca dos refugiados e da Europa. Foi a cimeira do medo. Medo da desintegração europeia, medo dos populistas, medo do furacão americano que quer desintegrar a UE, medo da cimeira da NATO que aí vem. Medo de tudo.
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