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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
The Reader
Hoje estive a ver este filme absolutamente extraordinário.
O filme é a adaptação cinematográfica do livro O Leitor do escritor alemão Bernhard Schlink.
Como todos os bons filmes é polissémico e riquíssimo nessa pluralidade de sentidos.
Conta a história de um rapaz de 16 anos que tem um affair, curto mas de efeito dramático, com uma mulher de 36 anos durante um verão no pós-guerra alemão. Uns anos mais tarde, ainda na universidade, descobre, por acaso, o passado nazi dessa mulher.
O filme lida com a 'culpabilidade alemã' dum modo explicíto: o livro de Karl Jaspers, filósofo alemão, A Culpabilidade Alemã (já uma vez falei dele num post) é expressamente citado.
Nos vários graus da culpabilidade alemã estão representados os que cometeram os crimes, o regime que o permitiu, os que conheciam os segredos e os calaram e toda a complexidade do assunto.
Naquele romance, a mulher mais velha representa a velha alemanha nazi, ignorante, agressiva e amoral, mas absolutamente fascinante; o rapaz de 16 anos representa a nova alemanha que tenta afirmar-se a partir da outra e lidar com os segredos da outra.
Nisso o filme está extraordinário: vemos que é a mulher que revela ao rapaz as suas potencialidades e, nessa medida, lhe permite a afirmação e o desenvolvimento como pessoa; por outro lado, a descoberta do passado nazi dessa mulher/amante -com quem o rapaz, e mais tarde o homem, solitário e em permanente sofrimento, tem uma relação de profunda identificação ao nivel do que há de mais intimo no ser humano- revela toda a complexidade da culpa, a dificuldade de reconciliação necessária, a questão legal e a questão moral, a mistura de sentimentos de amor-ódio-culpa, filho e amante da pátria mãe. Como é possível viver ou amar depois de se perceber que aqueles a quem olhamos como exemplos, mentores (pais, professores, etc) e a quem amámos estariam, ao mesmo tempo que nos amavam e ensinavam, implicados em crimes horrendos? Essa é a questão.
O rapaz, já homem, tem para com a mulher um acto de profundo amor, ao dar-lhe a possibilidade de tomar consciência do seu crime e de ter, desse modo, um certo tipo de redenção. Deu-lhe a possibilidade de re-ganhar um rosto humano, uma espécie de reconciliação com o mundo e consigo própria. É absolutamente comovente essa cena, de cortar a respiração.
A maneira como os personagens são filmados, o cenário e as cores revelam-nos as emoções profundas e as lutas interiores por que passam dum modo que vai do mais cru ao mais comovente.
Um filme que impressiona e faz pensar.
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