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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
Na manhã de 9 de Fevereiro, L. V. C. parou o carro no tabuleiro da Ponte 25 de Abril, no sentido Lisboa-Almada. Saiu do Ford Fiesta e saltou para o rio. Há vários meses que o professor de música da Escola Básica 2+3 de Fitares (Sintra), planearia a sua morte. Em Novembro escreveu uma nota no computador de casa a justificar o motivo: "Se o meu destino é sofrer, dando aulas a alunos que não me respeitam e me põem fora de mim, não tendo outras fontes de rendimentos, a única solução apaziguadora será o suicídio".
O professor de música desabafou que não suportava mais dar aulas àquela turma do 9º ano: "Nos últimos meses, já se acanhava perante os seus alunos como se tivesse culpa", explicou ao i um familiar. Atravessar o corredor da escola foi um dos seus pesadelos, é aí que os alunos se concentram quando chove: "Um dia, chamaram-lhe cão." Nos outros dias, deram-lhe "calduços" na nuca à medida que caminhava até à sua sala de aula.
Houve vezes em que L. V. C. expulsou os alunos da sala, vezes em que fez participações disciplinares. Foram pelo menos sete as queixas escritas que terá feito à direcção da escola, alertando para o compIstoortamento de um aluno em particular. Colegas e familiares do professor de música asseguram que a direcção não instaurou nenhum processo disciplinar.
Alguns professores testemunharam a "humilhação" de L. V. C. nos corredores da escola e sabiam que se sentia angustiado por "não ser respeitado pelos alunos". Só não desconfiavam que a angústia se tivesse transformado em desespero. O professor de música não falava com ninguém. Chegava às sete da manhã para preparar a aula. Montava o equipamento de som, carregava os instrumentos musicais da arrecadação até à sala. Deixava tudo pronto e depois entrava no carro: "Ficava ali dentro, de braços cruzados, e só saia para dar a aula." L. V. C. preferia estar no carro em vez de enfrentar uma sala de convívio cheia de colegas: "Era mais frágil do que nós, dava para perceber que não tinha o mesmo estofo." i
Isto é absolutamente chocante. As participações disciplinares sem que nada aconteça é o pão nosso de cada dia nas escolas. Há turmas em que o livro de ponto tem 20 ou 30 ocorrências sobre uma turma sem que um único processo de averiguação se faça, As pessoas deixam de fazer queixa, porque é ainda pior, quer dizer, o aluno saber que o professor faz queixa do seu comportamento e que ninguém liga nenhuma.
Mas é chocante também a apatia dos outros professores perante a humilhação dum colega que já nem sai do carro! Uma pessoa completamente só e a sentir-se acossada por todos.
Acho isto inacreditável e revoltante. Como é que as pessoas testemunhavam estas humilhações, sabiam que era uma pessoa frágil e não faziam nada?!
E a Direcção da escola? Como podia aceitar ter um professor naquela situação e uma turma a crescer em poder e violência? E nenhum dos pais sabia pelos filhos o que se passava?
Isto é chocante.
Um indivíduo num sofrimento público e constante deixado completamente sozinho.
Esta é a cultura que hoje em dia está instituída nas escolas. Os alunos podem fazer qualquer coisa que a culpa ainda é imputada ao professor como se fosse normal que os alunos se portem como bestas selvagens tendo o professor que ser uma espécie de domador de feras.
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