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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
Doentes devem poder optar pelo medicamento que compram na presença do farmacêutico, não do médico.
As actuais receitas médicas vão ter que ser alteradas a partir de 1 de Novembro, depois de a Ordem dos Farmacêuticos (OF) ter questionado o modelo em vigor, por obrigar os doentes que pretendem exercer direito de opção sobre os medicamentos que compram na farmácia a pronunciar-se no momento da consulta, na presença do médico.
Há, justifica, uma “assimetria da relação médico/doente”. A OF defendeu, desde o início, que a “inquirição ao doente, por parte do médico, vem limitar a liberdade” do exercício do direito de opção, que deve ter lugar “perante o farmacêutico, no momento da dispensa”.
Não estou por dentro dos meandros desta guerra de modo que torna-se difícil perceber o que está em causa para lá das aparências do que é dito nos jornais que, como bem sei a propósito dos temas da educação, vão da verdade até à fábula mais elaborada. No entanto, se as decisões têm sido tomadas com os argumentos que são adiantados nesta notícia, acho esta alteração incompreensível.
Falo por mim. Gosto dos meus médicos/as, tenho confiança neles. Quando não tenho mudo (que eu saiba no SNS a pessoa também pode escolher o médico). Em todos os casos em que me passam receitas, optam sempre pelos medicamentos mais baratos e explicam-me os princípios activos dos medicamentos. Se tenho dúvidas, pergunto. Confio muito mais nos médicos que me conhecem medicamente do que no farmacêutico, embora o conheça e, ele a mim, há uma vintena de anos.
O argumento de as pessoas não terem liberdade de fazer perguntas ao médico ou pedir um medicamento mais barato é duplamente ofensivo: em primeiro lugar, dá a entender que todos os médicos são vigaristas que passam medicamentos caros para lucrarem alguma coisa com isso - ora, nem acredito que a maioria dos médicos sejam vigaristas e, mesmo que o fossem, o mesmo argumento se pode, então, aplicar aos farmacêuticos, que serão tão permeáveis ao suborno como os médicos, de modo que seria apenas uma questão de tempo até os laboratórios começarem a cativar farmacêuticos em vez de médicos... em segundo lugar, o argumento da assimetria entre médico-doente dá a entender que o médico não se vê a si próprio como um profissional mas como uma entidade superior, que não deve explicações a ninguém, o que é extremamente ofensivo, isto é, pensar que os médicos são todos assim tão estúpidos e perigosos...
Isto para mim é o mesmo que um aluno vir ter comigo e pedir-me um livro de exercícios que seja bom para o seu caso de estudo. E indico-lhe um, dois ou três adequados para o caso dele. Depois, ele vai à livraria para comprar e o livreiro diz-lhe, 'Não senhor, há aqui um muito mais barato e vende-lhe esse...'
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