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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
Ontem comprei num alfarrabista, que tem uma banca no Jumbo de Setúbal, um dicionário em dois volumes, de Fonseca e Roquete, de 1848. É de uma editora francesa referida como 'Livreiros de suas Majestades, o Imperador do Brazil e El-Rei de Portugal'.
O dicionário está todo manchado da humidade e a encadernação, muito bonita, em pele, está um bocadinho comida nas pontas. Os dois livros estão um bocadinho maltratados mas ainda em bom estado. E são uma jóia. Negociei o preço e chegámos a acordo no preço, o que foi bom para os dois, pois eu dificilmente encontraria noutro sítio este dicionário, e o vendedor dificilmente encontraria outra fanática por dicionários antigos como eu disposta a comprar um neste estado.
Gosto imenso de dicionários já vestutos. Não é apenas pela descoberta de palavras que, apesar de terem caído em desuso, são perfeitas, como mísseis guiados, vão direitos ao coração das ideias; é também pelo modo como os dicionários eram concebidos. Explicava-se o sentido etimológico, histórico ou filosófico dos concietos, e fazia-se a diferenciação subtil dos seus significados sinonímicos e do seu uso nos diversos contextos, muitas vezes recorrendo aos grandes escritores da Língua Portuguesa como testemunhos duma determinada interpretação. Aprende-se imenso a ler estes dicionários. E têm expressões muito engraçadas.
Este vem em dois volumes: o primeiro é um 'Diccionario da Lingua Portugueza' e o segundo é um 'Diccionario de Synonymos seguido de Diccionario Poetico e de Epithetos'. Ficamos a saber que este é o primeiro Dicionário de Sinónimos da nossa Língua. Antes deste havia um Vocabulário de Sinónimos, em dez caros volumes, então esgotado.
Pág. 104, entrada 150 - Baixo, Vil - "(...) Quanto mais elevada é a dignidade d'uma pessoa, tanto mais baixa e desprezivel se faz, se não sabe sustentál-a; pois o homem só é grande por suas acções. - Vis são os homens quando se vendem ou prostituem. - Baixo é o homem que abate a sua dignidade, e vil, o que perde a estima dos outros e ainda a sua propria. - Baixo é o que por cobardia soffre injúrias de outrem; e mui vil o que as soffre contente, por seu interesse e com o fim de fazer fortuna por meios indecorosos. - O descarado adulador, que nem animo tem para saber callar, é baixo; e o mais vil dos homens é o que vende sua honra e sua consciência para adquirir dignidades e riquezas. (...)"
Precioso! E esta descrição dos vis e dos baixos faz mesmo lembrar certas alminhas do nosso panorama político...
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