Quem olha para a quantidade de partidos e movimentos que povoam a esquerda em Portugal, pode sentir-se tentado a dizer que esquerdas há muitas. Além do PS, do BE e do PCP, é cada vez mais frequente ouvir falar nas iniciativas organizadas pelo Livre, pelo Tempo de Avançar, pelo Juntos Podemos, pelo Fórum Manifesto, pelo Manifesto 3D, pelo MAS, pela Renovação Comunista, pelo I...
1 - Tempo de Avançar é um slogan de campanha para as legislativas?
Não. Tempo de Avançar é um movimento de cidadãos que junta apoiantes do Livre, do MIC-Porto, da Renovação Comunista ou do Fórum Manifesto, que já se conhecem de outras andanças.
2 - Qual é a relação entre Tempo de Avançar e Livre?
Atenção, o Livre não é o Tempo de Avançar, é um partido lançado por Rui Tavares no final de 2013. Por não ser um partido, o Tempo de Avançar vai usar o Livre como barriga de aluguer para levar a votos as suas candidaturas cidadãs às legislativas, com o objetivo de fazer o PS olhar para a nova esquerda.
3 - Rui Tavares não é do Bloco de Esquerda?
Não. Rui Tavares começou por ser eleito eurodeputado nas listas do Bloco, mas rapidamente se afastou para cortar com os vícios da democracia e fundar um partido no centro da esquerda. O Livre organiza-se de uma forma mais aberta, com plataformas de discussão online e primárias para escolher os seus candidatos.
4 - Além de Rui Tavares, quem mais está no Tempo de Avançar?
Várias personalidades que estão ou estiveram ligados a outras organizações políticas, como: Ana Drago, António Avelãs, Daniel Oliveira, Cipriano Justo, Castro Caldas, José Reis, Isabel do Carmo, Miguel Vale de Almeida ou Viriato Soromenho-Marques. Todos eles fazem parte do Conselho do Movimento.
5 - Então, Tempo de Avançar é uma nova esquerda ou a mesma esquerda?
É uma nova esquerda, na qual converge uma parte da mesma esquerda de sempre, que se zangou consigo própria e que decidiu desvincular-se de. Não se culpe, é fácil confundir o todo com a parte.
6 - E onde é que entra o Juntos Podemos?
O Juntos Podemos também começou por ser dinamizado por uma ex-bloquista, como Joana Amaral Dias. Foi criado para ser a réplica portuguesa do Podemos espanhol, mas nasceu torto. Um mês depois de os 20 membros da sua comissão dinamizadora serem eleitos, 14 deles - incluindo a ex-deputada do BE Joana Amaral Dias e o jornalista Nuno Ramos de Almeida (Que se Lixe a Troika) - saíram e dissolveram o órgão.
7 - Porque é que isso aconteceu?
A zanga teve a ver com o facto de o MAS querer integrar esta plataforma de cidadãos fechada a partidos, o que foi visto como um "assalto por dentro".
8 - Mas... o que é o MAS?
É uma espécie de filho rebelde que se emancipou, saiu de casa dos pais e mudou de nome. Começou por ser uma corrente do BE chamada Ruptura/FER e protagonizada por Gil Garcia e, em março de 2012, numa festa que juntou 350 pessoas na Voz do Operário, em Lisboa, tornou-se no Movimento Alternativa Socialista.
9 - Quem está no MAS?
Entre os fundadores estão dissidentes do Bloco, como Gil Garcia, André Pestana e Sofia Rajado. Juntaram-se para recuperar a irreverência e a coragem política das origens do BE. Mas criar um partido não bastou. Em dezembro de 2014, o MAS quis integrar o Juntos Podemos e levou-o à cisão que estávamos a explicar mais atrás.
10 - Resumindo: o Juntos Podemos dividiu?-se porque o MAS (ex-BE) também queria integrar o movimento e isso irritou a Joana Amaral Dias (ela própria ex-BE) e o Nuno Ramos de Almeida, entre outros. Mas acabou?
Não. Sem a "Pablo Iglesias lusa", como um jornal espanhol chamou a Amaral Dias, o Juntos Podemos não se deu por dissolvido. Manuela Magno, ex-candidata presidencial, é agora um dos rostos do movimento que anda a recolher assinaturas para se tornar partido.
11 - Porque é que a Ana Drago e o Daniel Oliveira também estão no Tempo de Avançar, se eles faziam parte do Fórum Manifesto?
Essa é fácil. Porque o Fórum Manifesto é um dos movimentos que integra o Tempo de Avançar. Depois de Daniel Oliveira e Ana Drago deixarem o BE, em 2013 e 2014, respetivamente, o Fórum Manifesto ganhou novo fôlego, já sem as amarras do Bloco, e participou na Convenção Cidadã que instituiu, oficialmente, o Tempo de Avançar, já em janeiro deste ano.
12 - O Fórum Manifesto ainda tem alguma coisa a ver com o BE?
Não. O Movimento nasceu no interior do BE, mais precisamente na corrente Política XXI (liderada por Miguel Portas), uma das três forças políticas que esteve na fundação do BE. Mas, com a saída de Drago e Oliveira, desvinculou-se do Bloco.
13 - Afinal o Fórum Manifesto é ou não é um partido?
Não, na realidade, é uma associação política. Alguns dos partidos que originaram o Bloco de Esquerda dissolveram-se e deram origem a associações.
14 - Fórum Manifesto e Manifesto 3D é a mesma coisa?
Não, o Manifesto 3D - Pela Dignidade, pela Democracia e pelo Desenvolvimento: Defender Portugal foi uma plataforma criada para organizar várias convenções pelo País e procurar uma candidatura convergente às eleições europeias, em conjunto com o BE, o Livre e a Renovação Comunista. Mas não pense mais nisso: o Manifesto 3D "fechou a loja" em julho de 2014, sem cumprir o seu propósito.
15 - Quem dinamizou o Manifesto 3D?
Um dos apoiantes deste grupo era o ex-líder da CGTP, Manuel Carvalho da Silva. Mas outras personalidades integraram a lista dos subscritores iniciais do documento, como Daniel Oliveira, Boaventura Sousa Santos, José Reis, Raquel Freire, Isabel do Carmo ou Pilar del Río. Muitos deles estiveram na organização do Congresso Democrático das Alternativas, na Aula Magna, em outubro de 2012. Alguns, aderiram, entretanto, ao Tempo de Avançar.
16 - Voltamos ao mesmo e aos mesmos. Além de bloquistas, também havia no Manifesto 3D alguns renovadores comunistas. Esses não fazem parte do PCP?
Não. O XVI Congresso do PCP, em 2000, partiu os comunistas em dois blocos: o PCP da linha oficial e o grupo de Renovadores, decidido a "retirar as lições dos erros que os revolucionários cometeram" no passado, segundo se lê na página da Associação Política Renovação Comunista, de 2013.
17 - Quem são os renovadores?
Alguns exemplos: Carlos Brito, António Avelãs, Guadalupe Simões, Paulo Fidalgo ou Cipriano Justo são alguns dos renovadores. Nota: Também estão no Tempo de Avançar.
18 - No meio disto tudo, quem é que já foi a votos?
O Livre e o MAS. Ambos se estrearam como partidos nas eleições europeias de 2014, com Rui Tavares e Gil Garcia no topo das respetivas listas. Não elegeram ninguém. Não sendo um partido, o MIC Porto apoiou os candidatos perdedores do PS à Câmara do Porto, Elisa Ferreira (em 2008) e Manuel Pizarro (em 2013).
19 - Mas ainda há outro? O que é o MIC Porto?
O Movimento Intervenção e Cidadania foi criado para apoiar a candidatura presidencial de Manuel Alegre, em 2006, e dele fizeram parte personalidades como André Freire, Isabel Castro ou Helena Roseta. Oito anos depois, o seu braço portuense (MIC Porto) sobreviveu ao quase eclipse político do próprio pai.
20 - Quer dizer que Manuel Alegre sempre fundou um novo partido?
Não. Depois da derrota de Alegre, com uns respeitáveis 20% dos votos, os apoiantes do MIC ainda tentaram formar um partido, mas a pretensão não avançou. Hoje em dia, o MIC Porto é mais uma das forças políticas que integra a plataforma Tempo de Avançar.