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no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau
O discurso dele que começa no minuto 6.20 é demais! LOL
Fui a Veneza há cerca de dez anos. Gostava de lá voltar outra vez. Estou a ler 'As Pedras de Veneza' e as ilustrações reavivaram-me a memória. De todos os sítios onde fui na Europa dois houve que tiveram um efeito imediato de me transportar no tempo, embora de maneira diferente. Um foi Rouen, em França, o sítio onde Joana D'arc foi torturada e morta pela Inquisição - a cidade é medieval, a arquitectura é Normanda com aquelas casas de madeira com traves negras no exterior em forma de cruz. Tem bairros labirínticos e uma pessoa sente-se fora deste tempo, mergulhada no mundo medieval. Mas Rouen, que é uma cidade que as pessoas gostam, deixou-me uma impressão estranha. Uma atmosfera sufocante, assustadora e violenta. Não sei porquê mas passei lá dois dias sempre incomodada. Talvez algo das pessoas e dos seus sentimentos fique nos sítios - partículas..qualquer coisa. Ali em Rouen o ódio e a violência...enfim, Veneza foi o oposto, porque tem o efeito de nos atirar para outro tempo mas de um modo belo e romântico.
Não se pode ir sozinho a Veneza. Não tem piada nenhuma porque a cidade apela aos sentidos e à partilha. Em Veneza até as portas dos fundos dos prédios são bonitas e cheias de ambiente. Está cheia de pracinhas com coisas surpreendentes, sejam fontes, igrejas, pequenos museus, restaurantes típicos, pequenas fábricas... uma pessoa perde-se encantada com os sítios. Andar no Grande Canal e ver aqueles palácios todos, ir aos cafés na Praça de Sao Marcos, ver o entardecer da esplanada.
Estive lá em Maio e houve um dia que choveu tanto que a praça de São Marcos inundou e andávamos sobre traves apoiadas em estacas. Quando fui ver o palácio do Doge vi duas gigantes pinturas que retratam a praça inundada e vêem-se as pessoas -bispos, princípes, etc.- a andar nas mesmas traves sobre estacas, o que mostra como todo o passado é presente em Veneza.
Decididamente um sítio que se quer desfrutar em companhia certa.
Comprei a revista Sábado por trazer um artigo com excertos dos Diários privados do Salazar. Fiquei a saber que em 1947 o salário mensal líquido de Salazar era de 11.417$20, o que equivale a 4.483 euros, preços do ano passado...acho que isto arruina aquela tese que diz que o Salazar era pobrezinho. Ainda hoje um salário desses é um bom salário. Em 1947 quando as coisas custavam 2 mélreis, 5 tostões (não temos há muito moedas de tão pouco valor), o vencimento dele era de milionário!
Adora esta peça! Tão bem disposta!
Fui até ali ao Aranguez e encontrei a Andreia ...... Está a tirar o curso de Filosofia. Hoje em dia é quase um acto de coragem e certamente um acto de afirmação pessoal ir tirar um curso de Filosofia.
Fiquei bem disposta.
Doente. Por causa de um queijo fresco...
'Gosto das pessoas que olham para as estrelas e vêem coisas.'
por PEDRO SOUSA TAVARES
Ministério garante que as partes interessadas foram informadas.
"A esmagadora maioria dos municípios não sabe quais as unidades [escolas]" que vão ser reagrupadas, na criação dos novos mega- -agrupamentos, defendeu ao DN o vice-presidente da Associação Nacional de Municípios (ANMP), Fernando Campos. Já o Ministério da Educação (ME) diz que "todas as partes envolvidas foram informadas", nomeadamente "câmaras e escolas".
O Ministério diz que as escolas foram informadas. Céus! Que deferência! Que favor fizeram em informar as pessoas, uns que não têm escola para pôr os filhos, outros, que estão no desemprego! Que simpática esta ministra! E diz que foi acordado com as autarquias! Opá, se as autarquias estão de acordo, pois quem somo nós para criticar essas entidades que, como se sabe, se preocupam imenso, não com negociatas e futebol e obras e tal, mas com a educação do País!
Comprei um dicionário de onomatopeias: 'Pequeno Dicionário Luso-Brasileiro de Vozes de Animais (de Onomatopeias e Definições)' de Júlio de Lemos (secretário prepétuo do instituto do Minho).
Nem sabia que tal coisa existia! Apesar de se intitular pequeno tem mais de 150 páginar em formato A4. É de 1946 e é uma edição da Revista de Portugal. No fim tem um indíce dos autores citados (porque o livro tem pequeníssimos excertos das obras onde aparecem as onomatopeias em análise) e fica-se pasmo com a vastidão dos conhecimentos literários do indivíduo.
Sabia lá eu que o gafanhoto ziziava, que o falcão pipiava, que o garrano nitriava, que o cisne arensava....etc. Lindo! Se o meu trabalho fosse ler livros, descobrir livros, cuidar de livros, escrever sobre livros, ficava feliz!
A Introdução do autor começa assim: «Há num conto de Fialho certo misantropo que se comove perante uma bela árvore ou ao cabo do estudo de complicado insecto. Eu sou como esta personagem do fulgurante escritor: comovem-me as árvores frondosas e comovem-me aqueles que têm nas árvores o seu lar, os airosos passarinhos tagarelas - e tanto nuns como noutras é que eu vejo a verdade, talqualmente a atormentada Bimala do grande poeta hindu. (R. Tagore)» Não é uma delícia?
Fui ver este filme. Gostei. É um filme à Polanski. Uma intriga política, cheia de suspense. Uma atmosfera excelente. O filme quase todo é passado com meia dúzia de actores numa casa, como se fosse um palco, muito teatral. Os planos todos da ilha, com o mar e a chuva (tão bem filmada) criam uma atmosfera excelente. Depois as personagens...como há pessoas que toda a vida representam um papel e que se usam dos outros para se melhorarem no jogo, para melhoraqrem a sua mão no jogo, sem escrúpulos. Como os puros de coração nunca têm hipótese neste jogo viciado à partida e acabam sempre como despojos. A brutalidade com que a vida os trata.
Como qualquer bom filme de intriga política mostra as concavidades da alma humana e da eterna destruição dos verdadeiros pelos falsos. Os actores muito bons.
A música a criar uma sensação de expectativa, de algo com contornos indefinidos, como é próprio dos homens que vivem para acumular poder. Nas cenas de chuva intensa não há música e o ruído da chuva é tão avassalador que chove dentro de nós também.
Alguns pormenores muito simbólicos, como o do jardineiro que todos os dias tenta varrer as ervas das dunas que cobrem o pátio no meio de grande ventania, num esforço quase sempre inglório.
Homens sombrios
em tempos errantes
matam filhos
amigos e amantes
que a vida é poder
sem atenuantes.
bja
Talvez a peça de música mais romântica de todo o reportório clássico. Segundo se diz, a modos que plagiada do Berlioz. No entanto, a ópera do Berlioz, praticamente ninguém conhece ao passo que esta é uma das mais amadas dos 'ópera lovers'.
Aqui, tocada pela orquestra de Berlim, conduzida pelo Karajan, que era conhecido pela intensidade que acrescentava à música, nomeadamente nos 'tempos' muito slow. (Não está completo porque tem mais de 10 minutos).
Tem que se ouvir alto.
São duas coisas diferentes, a realidade e o real. Com a linguagem, os números e as imagens construímos um real que fala sobre a realidade mas que é diferente dela. Assim, por exemplo, apesar das pautas com as más classificações estarem afixadas e todos poderem ver como foram más, esquecemo-nos disso porque o que ficou gravado na mente foram os gráficos de barrinhas coloridas com desvios padrão e inferências de normalidade. Assim se explica também o facto de Portugal estar já com uma realidade de endividamento e pobreza grave e isso ter passado despercebido porque o real simbólico dos números e da linguagem dos políticos e da TV nos diziam outra coisa.
Quem anda nos ministérios e nas escolas de 'ciências de educação' lida com o real -fabricam-no- mas não com a realidade. Qualquer professor sabe que quanto mais alunos tem uma turma, a partir duma certa quantidade razoável, mais difícil de torna trabalhar com ela e tudo exige o dobro do esforço com menores resultados, mas quem está longe da realidade e lida com os números diz calmamente que isso é o senso comum dos professores porque os números até mostram turmas pequenas a terem insucesso. O universo simbólico dos números, revestido depois pela linguagem constrói uma representação da realidade desfazada, que é a que persiste, porque a maior parte de nós não contacta com as realidades mas sim com o universo simbólico que interpreta essas realidades.
Esta diferença entre o real -que diz que os alunos são, teoricamente, crianças, seres em desenvolvimento e em fragilidade- e a realidade onde os alunos são crianças ou adolescentes ou jovens capazes de grandes crueldades, violência e maldades, torna o discurso dos professores (que estão imersos na realidade) e da tutela (imersa no real simbólico) incomensurável: enquanto uns falam de um universo os outros falam de outro e não se entendem, com prejuízo para a organização da realidade...
Outra grande fonte de problemas, penso, é a ideia de mérito, que é muito falaciosa. Eu, por exemplo, faço questão de dar exemplos de pessoas reais que conheço e venceram adversidades com mérito e estudaram vindo de meios desfavorecidos, para motivar os alunos e inculcar neles a ideia de que vale a pena o esforço, mas tenho plena consciência disto ser uma falácia.
Na verdade são muito poucos os que conseguem vencer certo tipos de maus começos de vida e não basta ter mérito: é preciso ter MUITO mérito. Talvez um em cada não sei quantos mil consiga.
A ideia de que os alunos se estudarem muito conseguem sempre, é errada. Nem sempre é possível vencer todas as resistências do meio. Por outro lado, a ideia contrária, que reina ao mesmo tempo que a do mérito - a ideia de que, por estarmos numa democracia todos termos direito a tudo do mesmo modo (se uns passam os outros também têm que passar, mesmo sem estudar; se uns são bons a educação física e têm boas notas os outros também têm direito a ter, etc.) é outra fonte -a oposta- dos mesmos problemas.
Ambas as ideias -que todos têm direito a tudo e que só quem tem mérito é que vence- embora contrárias, vigoram esquizofrenicamente ao mesmo tempo tornando impossível qualquer vector de orientação positivo que ajude os alunos, nomeadamente os que estão sós -sem famílias e contextos seguros e nutrientes- na sua luta por uma vida melhor.
Na realidade (não no real, onde tudo parece sempre possível e a igualdade de oportunidades até tem percentagens favoráveis com paletes de sucesso) o sistema é extremamente injusto e penalizador dos que, à partida, já vão com grandes desvantagens em termos de qualidade de vida e de esperança num futuro de dignidade.
Para nós professores que lidamos com os dois universos, pois que conhecemos muito bem a linguagem e os números do Real, mas estamos todos os dias imersos na Realidade é angustiante testemunhar a hipocrisia do sistema e sentirmo-nos impotentes para inverter a situação.
A Si Mesmo
"Repousa para sempre,
exausto coração. Morto é o engano extremo
que eu supusera eterno. É morto. E sinto
que em nós de enganos caros
a mais da esp'rança, o desejar é extinto.
Repousa. Já bastante
hás palpitado. Coisa alguma vale
o teu bater, nem de saudade é digna
a terra. Tédio amargo
a vida, e nada mais; e lama é o mundo.
Quieto, pois. Desespera
por uma última vez. À raça humana o fado
não deu mais que o morrer. Ora despreza
a natureza, o triste
brutal poder que contra nós impera,
e o infinito vácuo do que existe."
Giacomo Leopardi (poesia de 26 séculos, antologia de Jorge de Sena)
"Garantir a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística, não podendo, em caso algum, o acesso ser recusado por insuficiência de meios económicos; O Estado assegura a existência de uma rede de estabelecimentos de ensino que cubra as necessidades de toda a população".
O Estado deixa, no entanto, de estar obrigado a "criar um sistema público" e a "estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino" -- excertos que são suprimidos da Constituição.
Estes dois pedaços de texto da proposta de revisão constitucional não me parecem pouca coisa, porque no primeiro se fala em capacidades: garantir segundo as suas capacidades? Vamos ter pessoas a medir as capacidades? As pessoas vão ser seleccionadas segundo as capacidades? É que os exames não medem, nem têm como objectivo medir capacidades, mas sim conhecimentos.
Em segundo lugar, retirar a obrigação de estabelecer progressivamente a gratuidade de todos os graus de ensino, juntamente com o facto de não estar obrigado a criar um sistema público, vai ter como resultado que quem quer tirar um curso e não tem dinheiro, vai ter que se endividar para o fazer, como nos EUA, onde o sistema já falhou e está em revisão.Ninguém ficará privado (teoricamente) de estudar por falta de dinheiro. Pode sempre endividar-se.
Na prática, em vez do governo isentar de propinas ou dar bolsas de estudo a quem não tem dinheiro, agarra nesse dinheiro, dá aos bancos, e os bancos emprestarão a esses estudantes dinheiro. Estes, para tirarem um curso, terão de se endividar por 20 anos...para benefício, não dos alunos, não do país, não da igualdade de oportunidadees, não da mobilidade social que caracteriza os Estados mais avançados...mas dos bancos!
O romance de Saramago, Ensaio Sobre a Lucidez...narra os acontecimentos que têm lugar numa capital de um país democrático não nomeado. Na manhã do dia das eleições cai uma chuva torrencial, regista-se um nível de votação baixo, mas à tarde, o tempo desanuvia e há uma corrida às urnas. O alívio do governo é, no entanto, de pouca dura, pois a contagem dos votos mostra mais de 70% de votos em branco. Incomodado por este lapso cívico, o governo dá aos cidadãos uma segunda oportunidade de votarem. Repete as eleições mas os resultados são ainda piores: 83%.
Os dois maiores partidos políticos entram em pânico. Tratar-se-á de uma conspiração para derrubar o sistema democrático? Se é, quem organizou os milhares de pessoas? Quando perguntam aos cidadãos porque votaram assim respodem que isso é do foro privado e que é um direito que têm esse de votar em branco.
O governo considera o movimento «terrorismo puro e duro», declara o estado de sítio, suspende as garantias constitucionais. Quinhentos cidadãos são escolhidos ao acaso e presos. Às famílias aconselha-se silêncio. Quando nada resulta o governo recorre, ele, ao terrorismo. Mas a população vai desarmando todas as ofensivas dando mostras de uma unidade inexplicável e de um alto nível realmente ghandiano de resistência não-violenta.
A mensagem do livro, segundo Žižek (onde fui buscar estes excertos que adaptei) não é tanto a indossulubilidade conjunta do povo e do governo como a natureza compulsiva dos rituais democráticos de liberdade. O que acontece é que, ao abster-se de votar, o povo efectivamente dissolve o governo. Porque é que o governo entra em pânico? Porque vê-se forçado a enfrentar o facto de só existir ele próprio, de só existir poder, na medida em que aqueles que lhe estão sujeitos o reconheçam.
A atitude dos votantes é um verdadeiro acto político na medida em que obriga a que nos confrontemos com o vazio das democracias actuais, recusando ser 'implicados' no processo.
(do livro Violência)
As pessoas vêem o que querem, o que julgam, o que pensam que sabem, mas não o que lá está.
No entanto, raramente põem em dúvida a sua percepção das coisas, antes duvidam do que lá está.
Desta forma o Gabinete de Avaliação Educacional (GAVE) rejeita a proposta da Associação de Professores de Biologia e Geologia (APPBG) que aconselhava a anulação da pergunta sete do grupo IV do exame.
O Ministério da Educação rejeitou esta posição depois de ter também entrado em contacto com especialistas. “Foi unanimemente reiterada a inexistência de qualquer erro na proposta de classificação presente nos critérios específicos de classificação”, disse num comunicado Helder Diniz de Sousa, presidente do GAVE.
Das umas uma: ou as questões da Biologia não têm uma resposta única e podem estar sujeitas a interpretação e, nesse caso, têm que ser aceites as interpretações apresentadas pelos alunos dentro do leque das possíveis -neste caso não há 'erros' propriamente falando; ou as questões da Biologia têm uma resposta única e, nesse caso, ou os especialistas do ministério estão certos e os outros errados ou são os da Associação de Professores de Biologia que estão certos e os do ministério errados. As duas coisas ao mesmo tempo é que não pode ser.
Em qualquer dos casos a questão torna-se interessante por duas razões: a 1ª é o ministério ter equipas a fazer exames que todos os anos dão barracas; a segunda, muito mais interessante é o caso deixar exposta a questão da pseudo-objectividade das ciências por contraste com as humanidades.
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