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da disciplina/indisciplina

por beatriz j a, em 17.03.13

 

 

 

 

Há muito tempo que penso que o problema da indisciplina dos alunos, salvo muito raras excepções, poderia ser resolvido e estar num mínimo residual se se resolvessem dois problemas:

 

1º o da legislação permissiva e desresponsablizadora da indisciplina:

2º o da atitude dos professores em relação à indisciplina;

 

Este segundo problema parece-me, aliás, mais importante que o primeiro; quer dizer, quando este se resolve até o problema da má legislação se consegue ultrapassar mas, se este persiste, nem uma boa legislação funciona.

 

O que eu vejo é que a maior parte dos professores acha que o problema da indisciplina é dos outros, nomeadamente dos outros professores.

Dizem, com frequência, uns aos outros ou, uns dos outros, 'a mim não faziam eles isso', 'eles sabem muito bem com quem podem e não podem fazer certas coisas', 'comigo não se atrevem a fazer certas coisas', etc.

 

Geralmente assumem, quando um aluno é mal comportado ou desonesto consigo, que o aluno em questão é uma pessoa má em si mesmo e os outros professores são ingénuos e deixam-se enganar; mas se o aluno se comporta bem consigo e mal com outros, assumem que o aluno é boa pessoa e que os outros é que não sabem lidar com ele...

Quer dizer, o problema são os outros que são, ou estúpidos ou incompetentes.

 

Quando ouço estas coisas fico espantada pois, sendo a profissão de professor uma profissão de relações humanas e lidando nós com milhares de pessoas na idade da adolescência, parece-me inevitável darmo-nos melhor com uns que com outros e de vez em quando chocarmos com alguns alunos e eles connosco de modo que, alguém pensar que é imune a problemas de relacionamento com alunos, ou é ingénuo ou palerma...

 

De facto, o que observo é que um grande número de professores acha que conhece a verdadeira face dos alunos, sendo que os outros andam a ser enganados ou, acham que eles é que têm a pedagogia correcta, sendo que os outros são todos uns incompetentes que não sabem usar a pedagogia correcta ou, eles é que vêm os problemas como são e os outros não percebem os problemas.

Ou seja, não admitem a possibilidade de outros caminhos -sejam pedagógicos, metodológicos/disciplinares e de avaliação- serem igualmente legítimos e haver uma dinâmica própria das relações humanas que não é simples nem linear.

Na realidade, são poucos, daquilo que é a minha experiência, os professores incompetentes mas, são muitos os que acham que todos os outros excepto eles são incompetentes.

 

Nunca mais me esqueço duma reunião de avaliação duma turma muito complicada, num primeiro período, há imensos anos. Alguns de nós dissemos que turma era complicada, que era preciso ter mão muito firme porque à menor possibilidade abusavam, que faziam muito barulho, que havia alunos agressivos com os colegas... etc.

 

Uma das professoras presentes, afirmou-se um pouco indignada connosco, disse que a turma com ela se comportava muito bem e que nunca tinha visto nenhuma resposta mal educada, que nem tal admitiria...

Quando chegou a vez do aluno representante da turma, que estava presente, falar, disse que achava que a turma não se portava assim tão mal como tínhamos dito, excepto na disciplina de ........ onde o barulho era de tal ordem que ninguém conseguia ouvir ou aprender nada. E que disciplina era essa? A tal da professora onde tudo corria muito bem e não tinha problemas nenhuns...

 

Ou seja, a bitola do que é aceitável em termos de comportamento, muda muito de professor para professor e, se um professor não se importa que os alunos tenham os telemóveis ligados e enviem mensagens, por exemplo, nunca terá problemas e conflito com os alunos por causa dos telemóveis, enquanto outro os terá com frequência. Se um professor convive bem com um grande nível de ruído não perceberá que outro diga que a turma faz demasiado barulho.

 

Como se o comportamento não dependesse de inúmeros factores e como se as pessoas fossem as mesmas pessoas com todos os outros e em todas as circunstâncias.

 

Uma pedagogia não é, à partida, melhor que outra (excepto em casos extremos de não funcionamento recorrente, claro) e tem muito que ver com o estilo dos professores, sendo que, o que funciona com uns pode não funcionar com outros e, até, as próprias disciplinas exigem competências e níveis de concentração diferentes.

 

Infelizmente, um grande número de colegas não tem esse entendimento de modo que partem logo do princípio que os outros estarão a fazer algo de errado que eles nunca fariam. À conta disso, os colegas mais novos que têm problemas com as turmas ficam calados, com medo que os achem incompetentes e os avaliem negativamente e os outros chocam muitas vezes com a falta de colaboração dos colegas por causa desta atitude de, 'eu é que vejo as coisas como são e os outros andam a ser enganados' ou, 'a mim não me faziam isso'.

 

Se tivessem mais respeito pelo trabalho dos colegas e se tivessem um espírito mais aberto, reconheceriam que há muitos estilos de pedagogia, muitos critérios metodológicos e de avaliação, muitas bitolas de disciplina/indisciplina e que nenhuma é melhor que outra em si mesma, mas apenas por relação a certos princípios e a certos objectivos determinados.

 

Um professor parte de um certo número de princípios valorativos que têm que ver com o seu estilo (mais ou menos exigente ou permissivo), de princípios pedagógicos (que se ligam à disciplina que lecciona e ao seu estilo de ser professor), de metodologias, e critérios de avaliação que têm que ver com os objectivos da disciplina.

O seu sucesso depende duma relação coerente entre estes elementos. Um professor não tem que ser igual aos outros, nem deve, em muitos casos.

 

Não admira que tantos professores resistam à ideia de serem avaliados por colegas...

 

O querer impôr uma -a sua- como a melhor ou a única verdadeira pedagogia é o maior impedimento a que se resolvam os problemas porque inibe a colaboração entre os professores, já que uns e outros acham que a sua maneira de ver os problemas é a única maneira de serem vistos e que o problema da indisciplina é a incompetência dos outros.

 

publicado às 17:05


Quando as mudanças não mudam nada...

por beatriz j a, em 27.11.12

 

 

 

 

Estive a ler no blog do Umbigo um relato de um professor acerca da indisciplina de duas alunas e do modo com a direcção da sua escola geriu todo o assunto, culpando-o a ele e fazendo-lhe 'bullying'. Em algumas escolas a questão da disciplina está completamente às avessas.

Sempre houve indisciplina. Nas escolas lidamos com adolescentes de variadas idades. Há sempre os que são agressivos, mal educados, provocadores, instabilizadores, etc. O facto de estarem em grandes grupos (turmas) só piora a situação, dada a necessidade de sobressair de uns e de pertença dos outros bem como a tendência para o conformismo, umas e outras tão bem explicadas e documentadas pela Psicologia.

Dito de outro modo, o grupo promove o sentimento de herói dos alunos com tendência para a indisciplina. O resto do grupo-turma, a não ser que tenha alguns alunos com perfil de liderança, cala-se e conforma-se por questões de necessidade de pertença: medo de ser excluído do grupo ou, às vezes, medo dos próprios alunos indisciplinados.

Os alunos indisciplinados são uma minoria mas podem fazer grandes estragos e arrastar outros atrás. Uma turma onde haja dois alunos indisciplinados que ninguém consiga controlar acaba por tornar-se toda ela indisciplinada em virtude do resto do grupo, normalmente bem comportado, se adaptar a um clima de descontrolo.

Sempre foi assim, é da natureza humana. O que mudou foi que, dantes havia, entre os pais, o ministério e os professores-escola, um acordo cultural e legal em que se dava prioridade à palavra do professor relativamente à do aluno, justamente porque se entendia a diferença entre o comportamento do adolescente aluno e do adulto professor.

Isso foi o que mudou: o MEC, desde o tempo daquela senhora de má memória, instigou uma desconfiança da sociedade sobre os professores por razões políticas que na época lhe interessavam mas que fizeram grandes estragos que agora são difíceis de reverter. Se juntarmos a isso a pressão que faz sobre as escolas para que aparentem não ter problemas de indisciplina -como se isso fosse humanamente possível, numa profissão onde tudo gira à volta de relações humanas e, com adolescentes! Só no dia em que os seres humanos estiverem lobomotizados!- e o receio que a maior parte delas tem que os pais façam queixas, dá nestes casos como o que naquele blog é descrito ou, como o outro que no ano passado levou ao suicídio de um colega noutra escola.

Este ministro fez grande publicidade ao novo estatuto do aluno mas este não mudou grande coisa, sobretudo porque, o que interessava mesmo mudar era a cultura do MEC nesta questão. Apesar da sociedade confiar nos professores, como mostram todos os inquéritos que se fazem, o MEC desconfia, por princípio, dos professores e das escolas. E, aí, reside o principal obstáculo para resolver os casos de indisciplina de um modo que contribua para um clima de respeito dentro das salas de aula, sem o qual nenhuma aprendizagem é possível.

 

publicado às 09:24


no cabeçalho, pintura de Paul Béliveau. mail b.alcobia@sapo.pt

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